Autor Tópico: Morte de PCs  (Lida 12693 vezes)

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Morte de PCs
« Online: Setembro 16, 2012, 01:18:35 pm »
Porque diabos os personagens dos jogadores podem morrer numa partida de RPG ? Eu questiono isso do ponto de vista da teoria de design de jogos mesmo.

Isso não faz o menor sentido, se levarmos em conta que o RPG é um jogo social colaborativo, complexo e demorado, com duração que pode variar entre 2 e 6 horas (sem contar a criação de personagem que pode ter levado toda uma sessão própria ). Ou seja: um jogador passa 1h30 - 2h criando persona e sendo "briefado" na campanha, pra morrer nos primeiros 15 minutos por causa de uma rolagem aleatória nos dados ?

Suspeito eu que, como outras coisas no hobby, isso seja mais um legado das origens wargamísticas deste - em Chainmail e Wargames não é pressuposto que os jogadores criem todo um background pessoal para as "pecinhas" e exércitos ali no tabuleiro. Nem tampouco que você interaja com o cenário ao redor a nível pessoal e crie todo um vinculo emocional com seu personagem. Nesse contexto, morrer (perder a "pecinha", e ter que criar outra) faz sentido. Porém, perder uma "pecinha" no RPG pode ser desastroso, frustrante, enfurecedor.

Existem grupos que usam uma espécie de "acordo de cavalheiros" (ou uma regra implícita) onde os personagens só podem morrer em momentos dramáticos ou importantes para a campanha. Em outras palavras, morrer para o Kobold magrelo no início do calabouço NÂO é legal, mas morrer para o Demônio Abyssal no fim do calabouço enquanto salva a princesa - no climax da campanha - pode ser. Porém mesmo para esses grupos essa regra nunca é formalizada, ela sempre fica escondidinha, como se fosse vergonhoso assumir sua existência ou algo assim.

Pois bem, eu gostaria de ver RPGs assumirem mais essa "regra". Explicitamente. Sem medo ou vergonha. Afinal, ela é mais condizente com a sua natureza, a meu ver, do que o legado de Chainmail que nos foi passado guela abaixo.

O que vocês acham ?

P.S: alguns jogos acabaram inventando alternativas para manter a galera viva: os clones de Paranóia e Freemarket, os contratos DocWagon de Shadowrun, o troupe-play de Ars Magica, as healing surges de D&D4, o aspecto generacional de Pendragon, etc.  Mas ainda assim são recursos muitas vezes "soltos" que não explicitam seu propósito no texto, e acabam caindo na "timidez" que citei acima, quando deveriam ser claros e assetivos.
The traditional playstyle is, above all else, the style of playing all games the same way, supported by the ambiguity and lack of procedure in the traditional game text. - Eero Tuovinen

Re:Morte de PCs
« Resposta #1 Online: Setembro 16, 2012, 01:25:14 pm »
Por que antigamente a parte de jogo era levada a sério. Vide Tomb of Horrors, criada para premiar quem chegasse no final da masmorra vivo.

Re:Morte de PCs
« Resposta #2 Online: Setembro 16, 2012, 01:33:24 pm »
Eu sinceramente acho que tirar o perigo de morte do jogo o deixaria muito chato.

cade a graça do desafio quando você não corre perigo de verdade ?
War never changes

Offline Madrüga

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Re:Morte de PCs
« Resposta #3 Online: Setembro 16, 2012, 01:39:48 pm »
Acho bobagem. Me admira você gostar tanto de simulacionismo nos quesitos mais panacas, tipo casar e criar porcos, e agora achar que personagem não deve morrer.


A ideia de continuísmo (personagens vivendo várias histórias) também passa pelo risco, e correr o risco de perder o personagem ou morrer faz parte disso. Faz parte do drama, pode ser gancho de histórias, etc.


Concordo com a parte do kobold magrelo (eu, como narrador, já trapaceei várias vezes para salvar personagens de morrer em momentos estúpidos), mas se personagens tiverem ciência que são imortais nesses momentos banais, o que vai impedir os caras de correr de cara no perigo, amparados por uma regrinha chorona?
"If there are ten thousand medieval peasants who create vampires by believing them real, there may be one -- probably a child -- who will imagine the stake necessary to kill it. But a stake is only stupid wood; the mind is the mallet which drives it home."
-- Stephen King, It (p. 916)


Re:Morte de PCs
« Resposta #4 Online: Setembro 16, 2012, 03:39:17 pm »
Creio que depende mais da concepção de jogo e do jogo efetivamente em uso. Um duelo em L5R é mortal, por exemplo. E mesmo as lutas mais "banais" podem escalonar em ferimentos gravíssimos em poucos momentos - pelo menos na 3E, mas creio que a 4E tenha mantido esses aspectos, ainda não a li. Então, há um risco real ali para os personagens, a linha que separa vida e morte deles é mais tênue, fácil de ser rompida. E isto é um propósito do sistema.

O ponto é que o parâmetro na discussão sempre é DnD. Como já dito centenas de vezes, este é um jogo heroico: salvar cidades, reinos, planetas and shit. E morrer para simples kobolds arruaceiros não é algo heroico. Esse "pacto de cavalheiros"/trapaça do mestre é necessária para o próprio jogo. Tanto, que existe um "conselho" específico sobre lidar com a morte dos personagens no DMG da 4e (p. 30 no original em inglês) e recomendo que leiam. (Lembro que tinha algo semelhante no DMG da 3.X, mas não sei ao certo, se alguém puder confirmar, agradecemos).

No fundo, tanto o Silva quanto o Madruga estão falando a mesma coisa.

Re:Morte de PCs
« Resposta #5 Online: Setembro 16, 2012, 04:10:36 pm »
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Porque diabos os personagens dos jogadores podem morrer numa partida de RPG ? Eu questiono isso do ponto de vista da teoria de design de jogos mesmo.

É uma consequência de aceitar alguma medida de aleatoriedade em RPG e tem o propósito de dar a percepção/ilusão de risco de morte, de forma não intencionalmente desejada pelo DM (ou seja, se você morreu, não foi o DM que quis - foram os dados/cartas).

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Pois bem, eu gostaria de ver RPGs assumirem mais essa "regra". Explicitamente. Sem medo ou vergonha.

Consequência lógica disso - RPG vira um Seriado Infantil.

Re:Morte de PCs
« Resposta #6 Online: Setembro 16, 2012, 04:24:58 pm »
É Bispo, mas esse "acordo de cavalheiros" só é defendido pelas novas edições de D&D. No velho OD&D a idéia era desafiar mesmo os jogadores, sem manipular rolagens pra salvá-los. O exemplo apontado pelo Gegê é prova disso: os módulos antigamente eram feitos pra matar jogadores mesmo, sem dó nem pena.

E isso acabou ficando algo meio esquizofrênico com o passar do tempo, já que as regras dizem uma coisa enquanto (alguns) textos dizem outra (pra dar prioridade às demandas da estória/campanha, ou seja, só mater personagens quando for "narrativamente ou dramaticamente apropriado".

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Eu sinceramente acho que tirar o perigo de morte do jogo o deixaria muito chato.

cade a graça do desafio quando você não corre perigo de verdade ?

Oras, mas a única fonte de tensão é a morte do personagem ? Porque não tirar ou penalizar o mesmo de outras maneiras ao invés da morte? Se tiver uma rolagem ruim, ou perder um combate ou desafio, porque não aprisioná-lo/amaldiçoá-lo/aleijá-lo/etc ? Além de demonstrar uma consideração maior pelo jogador que investiu horas de dedicação e envolvimento emocional com o personagem, essa opção pode até ser fonte de ganchos que irão enriquecer ainda mais a campanha.

Um jogo que acatasse explicitamente esse "acordo de cavalheiros" poderia estabelecer penalidades mecânicas e ficcionais claras para a derrota dos jogadores frente a obstáculos.: perda de XP, redução de stats, acréscimo de um trait negativo, perda de status social ou ente querido ou ítem de poder, etc, etc, etc. Não sei exatamente como isso poderia ser implementado - acho que vai depender também da temática e/ou premissa de cada jogo - mas não acho que seria algo difícil de fazer.

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Consequência lógica disso - RPG vira um Seriado Infantil.
Então ele já é um, porque a maioria das mesas que conheço fazem exatamente isso - o mestre poupa os jogadores até onde ele acha que é dramatica/narrativamente interessante alguem morrer. O Madruga mesmo admitiu que faz isso. Eu também já fiz. Vários GMs que eu conheço já fizeram.

Pois bem: não tá na hora de parar de enrustir seu Seriado Infantil de Filme de Horror, e admitir a verdade ?
« Última modificação: Setembro 16, 2012, 04:27:56 pm por silva »
The traditional playstyle is, above all else, the style of playing all games the same way, supported by the ambiguity and lack of procedure in the traditional game text. - Eero Tuovinen

Re:Morte de PCs
« Resposta #7 Online: Setembro 16, 2012, 04:39:35 pm »
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Então ele já é um, porque a maioria das mesas que conheço fazem exatamente isso - o mestre poupa os jogadores até onde ele acha que é dramatica/narrativamente interessante alguem morrer. O Madruga mesmo admitiu que faz isso. Eu também já fiz. Vários GMs que eu conheço já fizeram.

Pois bem: não tá na hora de parar de enrustir seu Seriado Infantil de Filme de Horror, e admitir a verdade ?

Nope. Eu realmente não vejo motivo em "trapacear a morte" se é altamente provável que ela vá acontece e o sistema a ser jogado não têm mecânicas que permitam reduzir o risco disso ao máximo (diversos RPGs tem isso). A partir do momento que se aceita o "Juízo do Dado" (ou Cartas ou Qualquer Mecanismo de Aleatoriedade) tal risco existirá e se não quer isso, a solução lógica é jogar algum sistema de RPG não-aleatório.

Afinal, RPGs em geral não são só "Regra do Drama" e "História" - eles também tem porções Táticas (seja Combate Social, Físico ou mesmo de Ideias).

Re:Morte de PCs
« Resposta #8 Online: Setembro 16, 2012, 04:50:53 pm »
Elfo, se você ou seu grupo adotam o "juízo do dado" ao pé da letra, beleza. Mas não é isso que acontece com a maioria dos grupos que conheço.

E, mesmo adotando o juízo do dado, você não acha incoerente um jogador passar horas e horas criando, desenvolvendo, e se envolvendo emocionalmente com, um personagem, pra depois perdê-lo em uma rolagem aleatória qualquer, e simplesmente passar a ser um espectador da sessão/aventura enquanto o restante do grupo continua jogado ?

Porque o GM, que muitas vezes cria, deselvolve, e se envolve com toda uma campanha e NPCs, tem o direito de ter sua obra propagada, e o jogador não ?

Nâo acredito que somente eu veja isso como uma incoerência do ponto de vista de teoria de jogos.
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Re:Morte de PCs
« Resposta #9 Online: Setembro 16, 2012, 04:52:02 pm »
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Eu sinceramente acho que tirar o perigo de morte do jogo o deixaria muito chato.

cade a graça do desafio quando você não corre perigo de verdade ?

Oras, mas a única fonte de tensão é a morte do personagem ? Porque não tirar ou penalizar o mesmo de outras maneiras ao invés da morte? Se tiver uma rolagem ruim, ou perder um combate ou desafio, porque não aprisioná-lo/amaldiçoá-lo/aleijá-lo/etc ?

Novamente não vejo graça num combate onde não ha perigo de morte. pra mim e o equivalente a jogar um jogo de tiro com um cheat de imortalidade.

Claro se o mestre quiser que os inimigos apenas incapacitem os pcs, para interroga-los mais tarde ou algo asim, por mim, tudo bem. mas eu tambem quero combates em que haja perigo de morte

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E, mesmo adotando o juízo do dado, você não acha incoerente um jogador passar horas e horas criando, desenvolvendo, e se envolvendo emocionalmente com, um personagem, pra depois perdê-lo em uma rolagem aleatória qualquer, e simplesmente passar a ser um espectador da sessão/aventura enquanto o restante do grupo continua jogado ?

Bem, esse é um risco que o jogador assume quando vai jogar um jogo cujas situações são resolvidas na base da aletoriedade dos dados
« Última modificação: Setembro 16, 2012, 04:54:53 pm por Overlord »
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Re:Morte de PCs
« Resposta #10 Online: Setembro 16, 2012, 04:55:50 pm »
Ué, mas que jogo de tiro que você morre ? Nenhum, que eu saiba.

Afinal, você sempre pode tentar de novo, dar re-load, etc.

Cite um jogo de tiro onde se você morrer, morre mesmo e tem que começar o jogo todo DO COMEÇO.
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Re:Morte de PCs
« Resposta #11 Online: Setembro 16, 2012, 04:56:43 pm »
E por que o mestre não pode deixar o jogador fazer outro personagem ?
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Re:Morte de PCs
« Resposta #12 Online: Setembro 16, 2012, 06:11:15 pm »
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Ué, mas que jogo de tiro que você morre ? Nenhum, que eu saiba.

Afinal, você sempre pode tentar de novo, dar re-load, etc.

Cite um jogo de tiro onde se você morrer, morre mesmo e tem que começar o jogo todo DO COMEÇO.

Ressurreição ou o equivalente disso existe em uma boa soma de RPGs, especialmente Fantasy Kitchen Sink.

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E, mesmo adotando o juízo do dado, você não acha incoerente um jogador passar horas e horas criando, desenvolvendo, e se envolvendo emocionalmente com, um personagem, pra depois perdê-lo em uma rolagem aleatória qualquer, e simplesmente passar a ser um espectador da sessão/aventura enquanto o restante do grupo continua jogado ?

É um risco que existe ao se jogar um jogo, oras. Se o jogador não quer correr esse tipo de risco, existem outras opções e formas disponíveis de jogar em muitos RPGs.

Eu conheço jogadores (4 dos 5 que mestro, por acaso) que ficam ainda mais importunados em ter que passar por um "GM Fiat" (especialmente se for óbvio) para evitar a morte do que em perder um personagem e fazer outro.

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Porque o GM, que muitas vezes cria, deselvolve, e se envolve com toda uma campanha e NPCs, tem o direito de ter sua obra propagada, e o jogador não ?

Porque GM e Jogadores são papéis diferentes ao lidar com RPG?

Ou, porque ao começar uma campanha o jogador já aceitou (implicita ou explicitamente) o risco de perder um personagem se ele se envolver em situações de risco e de rolagens de dado terríveis?

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Nâo acredito que somente eu veja isso como uma incoerência do ponto de vista de teoria de jogos.

O que há de incoerente em, um jogo em que envolve Riscos e Aleatoriedade, haver o risco de Morte? Porque eu me recusaria em princípio a jogar Dark Sun ou um RPG de Hard-Sci-Fi ou Cyberpunk onde eu não pudesse morrer.

Aliás, começo a imaginar o quão divertido deve ser jogar em Athas sabendo de antemão que não corro nenhum risco de morrer (e creio que isso vale para efeitos similares à morte, como paralisia, remoção de alma ou estar terminalmente ferido, certo?). :P
« Última modificação: Setembro 16, 2012, 07:21:50 pm por Dr. Strangelove »

Re:Morte de PCs
« Resposta #13 Online: Setembro 16, 2012, 07:01:25 pm »
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O que há de incoerente em, um jogo em que envolve Riscos e Aleatoriedade, haver o risco de Morte?

Em um jogo de tabuleiro ou similar onde a duração esperada é de 20 a 30 mins ? Problema nenhum.

Num jogo de RPG onde a duração esperada é de 4h ? Se morrer pode ir pra casa porque acabou a sessão pra ti.  XD
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Re:Morte de PCs
« Resposta #14 Online: Setembro 16, 2012, 07:20:31 pm »
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Num jogo de RPG onde a duração esperada é de 4h ? Se morrer pode ir pra casa porque acabou a sessão pra ti.

Isso não é incoerente, Silva. É só uma limitação inerente de RPGs - aqueles que são especialmente mortais sugerem você ter sempre duas fichas prontas para jogar (Dark Sun fazia isso, assim como Call of Cthulhu, IIRC).

Aliás, você não está reclamando de Morrer - mas sim de perder o controle do personagem devido a algum Risco existente em um RPG. É algo ainda mais extenso, para você o jogador jamais deveria correr esse risco.

Parece incrível para My Little Pony RPG. Não consigo ver o mesmo para Shadowrun ou Rokugan.
« Última modificação: Setembro 16, 2012, 07:24:21 pm por Dr. Strangelove »