SNEGSARA
Snegurāška Attmanṣāra
(Floresta da Trama de Madeira Celestial)
Gentílico: gsora (singular), gsorum (plural).
Idioma oficial: ishtara (
išṣāra).
Regime: Monarquia absolutista.
Regente Atual: Damqun Takâlum.
Exportações: Importações:Principais Cidades: Zaqrum’âlim (capital), Titurrum’âlim, Sîbum Elammakum, Turahu’mâtum, Dû-Hurshanûm.
Demografia racial: 50%
privodnaha, 30% humanos, 10%
gailel, 5%
haruum, 5% outras raças.
Características Gerais
Estranha, misteriosa, louca ou simploriamente imbecil. Snegsara é um reino com fama de inútil, desinteressante, maldito e lar de todo tipo de agrura possível. Não que ela realmente seja assim. Seus habitantes é que são, e fazem o possível para não perderem a fama, formando gerações de um povo que jamais revela a verdade a forasteiros, a fim de manter seus segredos milenares.
Não há como separar Snegsara da Floresta Celestial. O reino é a floresta e a floresta é o reino. Situada na encosta norte das Yerenzev, vizinha de Gerav e Gavagai, a nação avança até as cidades do sul de Neerghul, e suas fronteiras no leste encaram os primeiros sinais da arquitetura típica de Hyenhu. Numa região ainda dominada pelo clima montanhoso, o sul do reino é de um frio com ventos cortantes, enquanto o norte se encontra com as estepes neerghulyenu. Pouquíssimas regiões gsorum ficam fora da floresta; apenas algumas clareiras em colinas elevadas e um punhado de lagos em seu centro é que veem o sol o ano todo, sendo o restante coberto pelas copas das árvores frondosas há séculos.
Sendo do jeito que é, não é de se estranhar que os principais povos vivendo na região sejam os privodnaha e os gailel, além, é claro, dos incansáveis, insistentes e impertinentes humanos que insistem em se enfiar em toda terra que encontram. Não se sabe ao certo como ou de onde vieram essas raças, nem muito bem há quanto tempo estão ali – só os haruum, vivendo nas montanhas do sul, que com certeza escorregaram da neve de Gerav para um clima mais ameno, provavelmente quando alguma avalanche soterrou uma família infeliz há alguns milênios, dispersando seus filhos infelizes pela Floresta Celestial.
O que faz Snegsara ser tão estranha é um conjunto de peculiaridades que se instaurou no reino ao longo dos séculos, tão naturalmente quanto esterco de vaca gruda nas rodas de uma carroça velha – à força, com muita sujeira e de um jeito que pessoa nenhuma consegue tirar depois. A primeira e mais óbvia estranheza é o excesso de superstições envolvendo a floresta ou, mais especificamente, o solo da floresta. Um dois maiores medos dos gsora é pisar na terra de seu reino. Isso acontece por um fato comum a Gerav: há séculos, nas bases das montanhas, foram encontradas redes intrincadas de túneis, com esqueletos de um povo perdido, chamado pelos gsorum de Homens Velhos.
Naqueles tempos, o conhecimento sobre a existência da mácula ainda não havia sido registrado. Hoje os sábios do reino dizem que há uma imensa região maculada sob as Yerenzev, com todo tipo de monstruosidade selada sob as raízes das montanhas congeladas. O povo gsora, muito apegado a espíritos, juramentos, promessas e sendo extremamente escatológico, desde então desenvolveu a
segunda peculiaridade da nação: a Trama de Madeira.
É óbvio que não é possível a um povo sedentário viver sem plantar. A Floresta Celestial, com suas árvores gigantescas e de uma variedade de espécies encontrada em poucos outros lugares, oferece muito no que tange a alimentação do povo, mas não pode oferecer tudo. A Trama de Madeira é uma série excruciantemente elaborada de pontes, cordas, caminhos naturais e encantados, que passa por toda a mata
sem tocar no chão. Porque assim, os espíritos da terra não se perturbam com o pisar desajeitado dos mortais viventes na superfície. É claro que muitos pontos são contraditórios para qualquer estrangeiro: se os gsorum temem a própria terra, por que vivem nela? Se acreditam que o solo é amaldiçoado, por que plantam nele? Essas são apenas algumas das muitas perguntas envolvendo o povo da Floresta Celestial.
As respostas surgem aos poucos, e para um número reduzido de pessoas. Um gsora pode revelar que o próprio povo fora amaldiçoado num passado distante, graças a um juramento. Sussurra-se que os primeiros gsorum criaram um pacto com um dos espíritos-regentes das matas do lugar, mas acabaram cometendo perjúrio e, inevitavelmente, arcaram com as consequências – eles e todos os seus descendentes. Esse juramento é contado e recontado pelas pessoas do reino, apenas entre elas (especialmente para as crianças), a fim de lembrar sua condição. É um conto exemplar de como os gsorum lidam com tudo o que falam ou prometem:
toda letra pode ser um reino, toda palavra um mundo. Graças a isso, lapidaram-se ao longo das gerações, de modo a serem assustadoramente cirúrgicos em tudo o que dizem. Toda conversa entre gsorum é acalorada e torna-se um debate que pode escorrer por horas e horas. Já entre um gsora e alguém que não é do reino, toda querela tende a ser terminada pelo primeiro. Um filho da Floresta Celestial sabe sempre o que dizer, como dizer e quando dizer, de modo a deixar muitos povos desconcertados.
Talvez a terceira maior peculiaridade dos gsorum seja a já citada variedade racial – a nação, sendo composta majoritariamente por privodnaha e povos humanos, abriga também muitos gailel nas partes mais antigas e inexploradas da mata, além de um bom número de haruum, estes vivendo principalmente nas encostas das Yerenzev. Ainda que metade da floresta seja dos privodnaha, esses não dominam necessariamente todos os ramos do governo, e relacionam-se bem com as demais raças que, passados séculos, perderam um pouco da identidade
racial e tornaram-se mais
nacionais, graças ao ambiente que favorecia a união e o companheirismo, e às crenças que aos poucos equilibraram-se e tornaram-se uma só.
Religiões
Sendo os privodnaha uma das raças mais antigas de Snegsara, não é de se estranhar que sejam descendentes de um povo que há muito abandonou Avkhass. Da mesma maneira que os parentes da grande floresta no oeste, os privodnaha da Floresta Celestial e, por extensão, todos os outros habitantes, veneram a Matriarca, ainda que com muitos elementos que diferem da crença original, incorporando muitos espíritos e lendas de origem humana, gailel e, em menor extensão, haruum.
Uma história mítica que corre entre os gsorum guia o espírito da nação. É o
Conto de Grashka, a história de uma mulher que teria nascido há eras, Primogênita da Matriarca em Snegsara – pois eles crêem que a Grande Mãe tem um Primogênito em cada reino. Não se especula de que raça era Grashka, e todos concordam que, por ser uma Primogênita, seu corpo era de luz tangível, distante de limitações mortais. Enfim, é dito que Grashka nascera do amor da Matriarca com o Pai das Montanhas Geladas e, por isso, seu corpo era de um gelo frio como o alento do inverno e a brisa da noite, álgido como a vida nas montanhas, não como a terra que morre e esfria de tristeza. Ora, naquela época a Floresta Celestial ainda não era grande como hoje, mas sim uma mata selvagem que sofria com os ventos do sul.
Graskha teria pedido companhia à sua Mãe, que cuidava do resto do mundo, mas esta se recusou, dizendo que os Primogênitos devem viver sozinhos, até que seus outros filhos nascessem para agradá-los. A Matriarca fez sua primeira filha jurar que não procuraria mais ninguém, e assim Grashka o fez. Jurou que jamais buscaria companhia, e sua promessa durou anos, até que um viajante passou pelas montanhas. Era estranho, sujo, apagado, completamente diferente do esplendor do gelo multifacetado do corpo da Primogênita.
Mas era
alguém. E Grashka se apaixonou. Ao ter feito isso, seu coração se aqueceu, fazendo seu corpo regelado derreter completamente. Seu juramento a traiu, e ela morreu porque seu coração, parte de si mesma, procurou companhia.
Essa história é contada e recontada há séculos. Muitos detalhes são incluídos ou omitidos, sobre quem era o homem, ou o que aconteceu com as águas do corpo de Grashka. Mas a mensagem de que os juramentos afetam não só a mente, mas também o corpo e o espírito, é sentida carnalmente em todos o povo gsora, aqueles que medem as palavras, que oram em silêncio e que tomam cuidado com os ouvidos tocados por suas vozes.
Instituições, organizações, guildas
Instituições
Fincada no centro da capital Zaqrum, a
Casa Verde é o centro do governo de Snegsara. A política gsorum funciona como uma árvore, bem como boa parte de todos os conceitos vigentes na floresta; o líder do povo é chamado de Grande Rei, e considerado o tronco da sociedade. Abaixo dele, há quatro governantes, os Reis, cada um regendo um quarto cardeal da Floresta Celestial. Os quatro são os galhos da árvore, e os guerreiros da Guarda Verde são as ramificações menores. Todo o povo gsorum é considerado como sendo o fruto da árvore – e suas sementes, todas iguais, podem dar origem a novas árvores. Isso significa que, apesar de uma monarquia, Snegsara considera todos como iguais em essência, ainda que completamente abaixo do Grande Rei e dos demais governantes no que tange a assuntos políticos.
Organizações
Um grupo de privodnaha a serviço do grande rei,
os Escribas somam pouco mais de dez viajantes, designados a perambular pelo mundo em busca dos Livros Perdidos dos Homens Velhos, em cujas páginas haveriam as respostas para todas as perguntas do mundo. Esses andarilhos registram absolutamente tudo o que aprendem em suas viagens, em rolos de pergaminho intermináveis que, uma vez a cada ano, são levados de volta à Snegsara e então retrabalhados por copistas, que recriam todas as páginas em livros fantasticamente trabalhados. Assim, enquanto os Escribas não encontram os registros dos Homens Velhos, criam suas próprias versões dos Livros Dourados.
Talvez a única raça que ainda permaneça nas sombras, muitos dos gailel de Snegsara mantêm o que chamam de
O Clã da Penumbra. Basicamente, um grupo de sábios do povo-árvore, que não teme andar pela terra da Floresta Celestial. Proclamam-se guardiões do conhecimento, e sua sabedoria é procurada por muitos dos que buscam os segredos da floresta. Dizem que o Clã tem uma rede de informações que passa pelas raízes das árvores, e que podem descobrir qualquer coisa sobre qualquer um, mas isso talvez não passe de especulação.
Ligados ao Clã da Penumbra estão os
Guerreiros da Lama, uma espécie de milícia treinada pelo próprio povo, e organizada pelos sábios gailel, que patrulha as áreas mais baixas e assombrosas de Snegsara. Esses guerreiros são em sua maioria gailel silenciosos, mas há também humanos e privodnaha em suas fileiras, que estão em torno de trezentos combatentes.
Não formando necessariamente um grupo organizado, os
Dendromantes são conhecidos até mesmo em terras distantes de Snegsara. Não se sabe exatamente quantos são, ou se têm algum líder: o fato é que consiste-se de andarilhos que perambulam pela Trama de Madeira, todos muito velhos. Alguns deles são homens e mulheres senis, abandonados pela família, enquanto outros são mendigos e outros excluídos da vida comum de Snegsara. Sua presença é agourenta e evitada; sempre andam sozinhos, e são reconhecidos pelos trajes escuros carcomidos e uma grande runa vermelha, pintada na testa. Interpelam qualquer um que esteja passando pelas pontes altas e perguntam seu nome, então pedem esmolas; caso recebam, agradecem e abençoam, mas caso não consigam o que querem, rogam pragas e professam maldições para o futuro do interceptado, dizendo seu nome às árvores e pedindo para que elas neguem sombra e água ao “seu malfeitor”. Ainda que renegados, os Dendromantes trazem consigo um ar de sábios, instituído por muitas das profecias que realmente aconteceram. Isso faz com que seja normal os nativos ajudá-los com esmolas, ainda que tentem evitar os caminhos por onde eles comumente andam.
Logo abaixo dos generais da Guarda Verde estão os prestigiados
Malditores Reais. Feiticeiros especializados em rogar maldições sobre as fileiras inimigas, nenhuma expedição militar de Snegsara parte sem ter pelo menos um deles consigo. Enquanto os dendromantes são temidos por sua loucura aparente, os malditores são respeitados pela sua importância para a nação. São considerados verdadeiros profetas e dobradores de palavras, e segundo alguns são capazes de desmoralizar um exército inteiro com uma simples frase enunciada. Ainda que importantes e renomados, todos eles trazem consigo algum ar de mistério e alienação: parecem longe do mundo, captando vozes distantes, sempre ouvindo muito mais do que falam – de fato, de todas as superstições do povo envolvendo palavras, eles são os mais defensores do uso das mesmas: mesmo sendo uma patente elevada no exército, um malditor não carrega arma alguma além das suas próprias palavras e de um bastão ou uma vara, usado para tecê-las no ar ou na terra. Batalhas em guerras só começam após um malditor dizer que os augúrios assim permitem, caso contrário as tropas se retiram, tal é o poder de um deles para vaticinar o destino de seu próprio povo.
Principais áreas e cidades
Áreas
Ícone máximo do reino, e uma espécie de metáfora do mesmo, a
Trama de Madeira não é apenas um conjunto de pontes correndo como veias e artérias por Snegsara, mas um símbolo do coração da própria nação: entrelaçada, abrangente, uma gigantesca rede que liga todos os pontos da Floresta Celestial, partindo dos altos castelos da capital Zaqrum. Quatro são as vias principais, muito largas, construídas há séculos com madeira, cipós e quilômetros de tecidos, calafetados com betume obtido nos Baixios.
Nenhuma das Quatro Estradas, bem como todas as pontes ramificadas, é reta: próximas às cidades e vilas, e entre uma árvore e outra, podem até não ter nenhum desvio, mas em suas extensões maiores, serpenteiam por entre os galhos mais altos e os troncos mais baixos, seguradas por cordas e cipós presos às alturas. As quatro vias são patrulhadas dia e noite pela Guarda Verde, já que por serem as únicas estradas seguras e estritamente limitadas não raro aparecem bandoleiros e criminosos, além de grupos que tentam montar emboscadas ou cobrar pedágios de quem passa. Isso faz das Quatro Vias talvez o lugar mais seguro de Snegsara, além das pontes-ruas de Zaqrum.
Menores e ainda mais labirínticas são as Vias Menores, que percorrem toda a extensão da mata. São centradas em vários pontos de conexão, construídos em grandes torres de guarda espalhadas pela nação. São as Vias Menores que se ligam às clareiras e às áreas seguras do solo da Floresta Celestial, bem como são elas, e não as Quatro, que percorrem a orla da mata e carregam as grandes rampas e escadarias que levam à terra “limpa”, longe da sombra das árvores. Assim como as Quatro Vias, as estradas que saem de Snegsara são incansavelmente patrulhadas, já que são consideradas os únicos pontos seguros de saída e entrada na área florestal do reino.
O
Solo de Snegsara não é “completamente maldito”. Ainda que tido como amaldiçoado, ele só é especialmente evitado à noite, a hora em que os espíritos perambulam pelo mundo dos mortais. As duas transições (amanhecer e crepúsculo) são ainda mais temidas, pois é quando dizem que a fronteira entre os mundos está mais fraca. Do mesmo modo, as áreas em que a terra sai da sombra das árvores são consideradas abençoadas e até mesmo sagradas, sendo usadas como pequenas lavouras do que não é possível se plantar nos jardins suspensos.
Contudo, não só da lendária maldição da terra fogem os gsorum; o solo, além de conspurcado, é lar de todo tipo de aberração monstruosa. É dito que espécies de animais, distorcidas e maculadas, vagam por entre as raízes das árvores, ocultas sob a sombra das árvores ancestrais. Há quanto tempo estão lá é um mistério.
As colinas mais altas que cortam a floresta servem de alicerce para um dos projetos arquitetônicos mais ousados das Terras Sagradas (além da própria Trama de Madeira): os
Aquedutos dos Homens Velhos. Chamados assim por terem suas fontes nas Yerenzev, lar de supostos povos antigos, os Aquedutos são uma rede de calhas que desce desde riachos e cascatas nas fronteiras com Gerav e cobre toda a área sul de Snegsara, onde graças a isso é comum de se encontrar fios de água em pequenas cascatas caindo aparentemente da copa das árvores. Essa rede de calhas é velha e em muitos pontos encontra-se apodrecida, por falta de manutenção em suas juntas de madeira antiga. Por não ser coberta, não raro algum animal é encontrado morto por seus caminhos, contaminando a água que passa por ali e causando todo tipo de doença. Esse problema tenta ser resolvido por servos ligados à Guarda Verde, designados a inspecionar as calhas todos os dias.
Os Aquedutos estão entre os bens mais preciosos do reino de Snegsara, não só por sua importância arquitetônica lendária, mas ainda mais por sua óbvia utilidade prática: são deles que partem todas as ramificações que abastecem os jardins suspensos que pululam pela Floresta Celestial, e é graças à sua água que a população das partes mais altas sobrevive.
É graça aos Aquedutos que a Floresta Celestial tem uma das mais belas construções já criadas no Oriente: os
Jardins Suspensos de Tizqar, localizados praticamente no meio da Via Leste. A mais de cem metros de altura, e edificados em vigas sobre dezenas de níveis, os Jardins de Tizqar são únicos não só por sua variedade e beleza exótica, mas por suas técnicas agrícolas sem rival: sem terra no alto das árvores, seus cultivadores desenvolveram um sistema onde as plantas nascem, crescem e morrem em grandes canais contendo apenas água dos Aquedutos, tratadas com fertilizantes especiais e, dizem alguns, encantamentos antigos. As tais “plantas de água” são procuradas por forasteiros como verdadeiros itens mágicos, e não raro alquimistas e feiticeiros são vistos próximos às bancadas de venda dessas ervas nos Jardins.
Cidades
Pulsando como o verdadeiro coração da Floresta Celestial,
Zaqrum’âlim é uma incrível explosão de vida. Sendo o lugar onde as Quatro Vias se encontram, a capital foi construída inteiramente sobre as lendárias árvores colossais de Snegsara, algumas alcançando centenas de metros de altura. Caminhos intermináveis de pontes ligam um lugar a outro, transformando a cidade num labirinto para qualquer forasteiro.
Em seu centro e ponto mais elevado encontram-se os Castelos da Casa Verde, a sede do governo, edifícios gigantescos repletos de torres e luzes criadas por encantamento, ligadas por pontes de cordas e escadarias largas que descem as árvores em espirais centenárias. Um pouco abaixo dos Castelos encontra-se o Tablado Central, talvez o único arremedo de semelhança com uma cidade comum. Formado por um grande número de vigas ligadas aos troncos das árvores, o Tablado é coberto por um assoalho plano, dando origem a ruas e vielas livres, distantes dos caminhos pendentes nas alturas da floresta. É nele que ficam os maiores mercados e feiras, além de muitos dos prédios da realeza.
Há outros tablados em áreas menores e mais distantes do centro, assim como em outras cidades e vilas, mas os séculos de tradição ainda resistem à construção desse tipo de área, demonstrando a preferência dos gsorum pela natureza tortuosa da floresta.
Sîbum Elammakum não é uma cidade propriamente dita, mas sim uma
planta. Considerada sagrada desde tempos imemoriais, a chamada Grande Árvore é única em Snegsara, e até onde se sabe, nenhuma no mundo alcança as dimensões desta planta ancestral. Antigamente um grande centro de peregrinação, hoje Elammakum abriga milhares de fieis que, com o passar dos anos, tornaram-se habitantes do lugar, construindo casas, pontes e todo tipo de coisa sobre a árvore. E sem sair dela. Toda uma cidade se estende sobre os galhos frondosos da Grande Árvore, e muitos vivem em casebres erigidos em seu tronco, sendo este entrelaçado por centenas de metros de escadarias tão tortuosas quanto os próprios ramos do alto.
É em Elammakum que vive o povo mais crédulo e devoto à Matriarca, e seus habitantes dizem que a Grande Árvore nada mais é que a manifestação mais pura de sua grande mãe: independente, antiga, única, com os pés na terra e os braços no céu.
Na sombra das Yerenzev encontra-se a cidade-fortaleza de
Dû-Hurshanûm, construída sobre as ruínas atribuídas aos Homens Velhos. É praticamente a única cidade do sul de Snegsara cujos alicerces estão fincados diretamente na terra e, do mesmo modo, uma das poucas cujas construções têm pedras, além de madeira. Fortaleza apenas por herança de seus antigos habitantes, hoje em situação pacífica a cidade serve de ponto de partida para aqueles que desejam explorar as montanhas, sendo uma das localidades mais próximas dos Túneis, dispondo até mesmo de uma milícia que patrulha as cavernas e reentrâncias próximas. Todo tipo de história envolvendo os Homens Velhos nasce em Hurshanûm, graças à boa parte da população local ser de haruum exploradores e contadores de histórias.
Um grande número desses exploradores tem tido problemas nos últimos tempos com shas’tak, o povo monstruoso das Yerenzev. Enquanto alguns retornam com histórias escabrosas envolvendo cemitérios de Homens Velhos em grutas desses primatas, há um sem-número de aventureiros que desaparecem para nunca mais serem vistos, tanto nos picos escarpados quanto nos Túneis.
Na fronteira com Gerav encontram-se as terras de
Turahu’mâtum, um amontoado de várias famílias, principalmente humanas e haruum, que por séculos enfrentou os perigos das Yerenzev. Ainda que os exploradores de Hurshanûm conheçam as montanhas, não chegam aos pés da sabedoria secular angariada pelo povo de Turahum, também chamada de Terra dos Bodes. A parca muralha da cidade presenciou séculos de ataques dos hoje desaparecidos homens-bode salruk de Yerenzev, criaturas vis e monstruosas que, como cabritos-monteses, saltavam pelas pedras como se estivessem caminhando numa terra plana.
O povo tem medo, mas ama sua cidade; construída metade sob as árvores, metade com os alicerces na terra, Turahum é a principal passagem entre a terra dos haruum e Snegsara. Há tempos profetiza-se um retorno dos salruk e, caso eles retornem, os turahumum não se encontram despreparados: esperam. Tornaram-se exímios combatentes e negociantes. De um lado, patrulham a floresta e alguns poços de betume, enquanto do outro, perambulam pela neve e trocam armas de gelo encantado com o povo de Gerav.
A cidade de
Titurrum’âlim consegue a façanha de ser exótica em Snegsara. Situada na fronteira nordeste da Floresta Celestial, foi fundada numa época em que a nação se preparava para uma suposta investida de Hyenhu. Sabendo que aquela região da mata era a mais vulnerável, os militares erigiram uma fortaleza que, com o tempo de paz que se seguiu, tornou-se o centro da cidade. O exotismo vem do ambiente do local. Titurrum foi erigida como as maiores cidades de Snegsara, no alto das grandes árvores; porém, sua metade leste foi construída fora da sombra da mata, estendendo-se por muitas centenas de metros onde não há mais floresta alguma e, ainda assim, a cidade não toca o chão. Imensas toras de madeira formam uma estrutura que sustenta precariamente as casas e os grandes prédios, a dezenas de metros de altura, e suas fundações localizam-se num terreno pantanoso, uma área considerada tão fétida e calamitosa que dizem ser mais amaldiçoada que qualquer parte mais funda dos Baixios. Nessa periferia de Titurrum vivem as pessoas mais pobres da cidade, e apenas os deuses sabem o porquê de ainda viverem em tal condição. Há quem diga que algum juramento as prende, o que não seria estranho em Snegsara.
Em compensação, o lado oeste da cidade, sob a sombra da Floresta Celestial, resplandece tanto quanto a própria Zaqrum, sendo o palco preferido dos aedos de países distantes que se apresentam na Terra das Pontes.
A Floresta Celestial
A mata que abrange Snegsara tem seu nome devido a duas razões: uma óbvia, a de suas árvores gigantescas e que tocam o céu, e uma mais espiritual, que toma a floresta como algo puramente divino, diáfano. Por isso desde tempos imemoriais é chamada de Floresta Celestial. Nela existe toda sorte de seres fantásticos, animais mágicos e espíritos da natureza que arriscam manifestar-se nos domínios mortais – ainda que por essas terras inexploradas quem verdadeiramente se arrisca sejam os mortais.
O fato mais obscuro da Floresta Celestial é conhecido apenas por seus habitantes mais sábios, normalmente aqueles que dedicam a vida em devoção à Matriarca e à velha sabedoria do povo. Para eles, a história de Grashka ainda continua – Snegsara nasceu quando o corpo da Primogênita derreteu sobre as poucas, ressequidas e jovens árvores de outrora. Quando o coração dela se aqueceu, aquebrantou seus membros gelados que se partiram, enquanto seu músculo pulsante deslizou para as mais profundas camadas sob a terra. As grandes árvores
são Grashka.
Ela é Snegsara, e a Floresta Celestial nada mais é que uma manifestação da Primogênita.
Esse segredo é repassado indiretamente dos mais velhos para os mais jovens. “Respeite a floresta”, “proteja as criaturas”. Revelar a natureza espiritual da floresta é um fato impensável, e nem sequer cogita-se o que poderia acontecer caso o mundo soubesse disso. O que poderia ser uma verdadeira divindade renascida, enraizada nas terras de um país exótico.
Áreas selvagens e despovoadas
Os
Baixios são a parte mais baixa do solo de Snegsara, localizados no centro da floresta, a leste de Zaqrum. Formados por raízes ancestrais e riachos escuros que nunca viram a luz do sol, esses lugares são temidos mais do que a própria morte pelos gsorum, que acreditam que a água lamacenta é uma porta de entrada para o mundo dos mortos. Fogos-fátuos tornam os Baixios ainda mais tenebrosos, e alguns privodnaha afirmam terem visto aparições periódicas de fnugsata por entre os ramos retorcidos. São nesses locais nefandos que se encontram os poços de betume, visitados pelo menos uma vez ao ano pelos artesãos do governo, em busca da matéria-prima para remendar as pontes da Trama de Madeira.
Existe na floresta uma espécie de espírito aparentemente só encontrada aqui. Os sábios sabem que se tratam de manifestações menores de Grashka, mas os nativos os chamam de
Filhas da Terra: assemelham-se a mulheres na flor da idade, adultas e jovens, cuja pele é branca como a lua e os cabelos, sempre longos e esvoaçantes, negros como a noite. Trajam levíssimas vestes delicadamente trabalhadas com padrões orgânicos, espirais e mosaicos intrincados, cujo tecido parece ter sido feito por pura feitiçaria. Não se sabe quantas Filhas existem, mas é de conhecimento geral que elas podem ser vistas comumente à noite, e ainda mais facilmente ao entardecer. Andam pelos galhos mais altos como se estivessem pisando em rocha sólida, e estes sequer envergam sob seu peso. Nunca falam, mas é possível ouvi-las cantar uma interminável música melancólica em noites de lua cheia.
Os
Túneis dos Homens Velhos são conhecidos há tempos pelos gsorum, ainda que estejam longe de completamente explorados. Não se sabe o quão profundos são, nem sua extensão exata, mas especula-se que percorram as raízes das Yerenzev desde o leste de Snegsara até seu limiar oeste, na fronteira de Gerav com Gavagai. Habitados por shas’tak em muitas de suas grutas tortuosas e geladas, há neles salões que exibem ruínas de uma civilização perdida, emoldurados por colunas que parecem sustentar o peso das montanhas. Há muito que existem apenas esqueletos e animais selvagens que usam as ruínas como abrigo, assim como toda sorte de criatura monstruosa nas partes mais baixas e obscuras. Recentemente, contudo, surgem boatos (especialmente em Gerav) de que espíritos ancestrais e assombros feitos das chamas do coração da terra têm despertado nas profundezas.
Há, no sopé das Yerenzev, relativamente próximo à Durshanûm, uma ruína relativamente bem conservada, que abriga outro dos segredos de Snegsara. Atualmente escondido por camuflagens e feitiços, o
Portal das Feras é o lugar mais vigiado e resguardado da Floresta Celestial, até mais que os castelos da realeza em Zaqrum. Por trás de suas imensas portas de pedra e ferro, há escadarias e corredores abandonados que levam para todas as direções, num labirinto imenso; um desses caminhos, contudo, leva aos chamados Cárceres Sombrios, por onde vagam criaturas estranhas. Não se sabe como sobrevivem sem comida, nem há quanto tempo estão lá; o que verdadeiramente preocupa os gsorum são as Duas Bestas: gigantescas feras, verdadeiras quimeras monstruosas, que estão presas por correntes colossais às fundações das montanhas, no maior dos salões. Sabe-se que essas bestas falam, e existe a certeza de que enlouquecem quem as ouve: cadáveres de centenas estão caídos sob suas sombras, e as patrulhas que visitam o local uma vez por semana previnem-se com todo tipo de parafernália, banal e encantada, para não escutar o falar das duas.
Ganchos para aventuras
Snegsara é uma terra exótica e pacífica, mas com tantos problemas como qualquer outra nação. A Floresta Celestial abriga um povo que ama o lugar onde vive, e faz de tudo para proteger os espíritos da mata à sua volta. Os mundos são mais próximos aqui, gerando todo tipo de interação com bestas mágicas e espíritos ancestrais por entre as árvores.
- Um dos reinos de Neerghul tem um novo príncipe... e ele não entende porque não pulverizou Snegsara até hoje. Os PJs fazem parte de uma expedição que tem que convencer esse tolo príncipe da necessidade da floresta.
- A linha entre os mundos físico e espiritual é tênue na mágica floresta de Snegsara... e algumas pessoas começaram a desaparecer misteriosamente. Trilhas apontam para espíritos travessos da natureza... e talvez um intruso de terras distantes.
- Deslizamentos de terra e estranhos temores ameaçam Dû-Hurshanûm. Parece que algum mal antigo está à solta... e quando animais e insetos fogem dos túneis dos Homens Velhos, parece que é lá que a resposta desse mistério se oculta.
- Grupos de shas'tak armados com estranhas ferramentas e itens alquímicos assaltam Turahum... e quando tudo parece apontar para uma interferência de Daguna, outras evidências surgem... quem estará por trás dessa intriga entre reinos?
- Quando ninguém mais ouve as algaravias dos dendromantes, eis que um deles faz uma profecia assustadoramente real: criaturas elementais feitas de água lamacenta dos Baixios começam a assolar a Trama de Madeira e os gsorum, aterrorizados, precisam da ajuda dos PJs para vencer esses monstros impuros e impedir que eles reapareçam.
- PJs interceptam rumores de que um dos livros dos Homens Velhos teria sido descoberto nos túneis e traficado para Pehelnaur pelos Lâminas Azuis... mas a essa altura, o tempo é o maior inimigo desses aventureiros, que precisam impedir que estrangeiros se apossem dos maiores segredos das montanhas.
- Um lomkev de Bujdret é encontrado morto nos Aquedutos dos Homens Velhos... segurando um dente de tigre. Os PJs descobrem que recentemente um príncipe de Neerghul foi assassinado... mas que interesse um assassino tão distante pode ter nos assuntos do Leste? Um mensageiro de Hyenhu entrega uma misteriosa mensagem: "fiquem fora do que não é assunto de seu povo". Mas por que a pacífica floresta de Snegsara foi envolta em tamanha trama?
- Uma das sementes de Elammakum aparece, depois de mais de cem anos, e é a esperança de perpetuar a magia de Snegsara. Contudo, pistas revelam que alguém sabia desse nascimento, e a única semente que ainda poderia dar frutos está irremediavelmente maculada. Como ela tocou o solo, os nativos nada podem fazer, e os aventureiros precisam peregrinar para salvar essa semente. As fontes límpidas de Seraj Zatam parecem a última esperança... mas os assassinos de Pyodinn não fazem nada de graça.