Vincer: Não querendo entrar fundo no assunto mas ao meu ver grande parte do problema está na confusão entre homossexualidade(definição) e causa(s, plural no caso). Tratar esse fenômeno como uma coisa só é onde me parece haver o maior erro. É quase inevitável pela falta de termos específicos, mas predisposição genética ou não, panorama social, comportamento e tudo o mais se misturam e confundem.
Concordo que seja multideterminado, e ressalto isso no texto, mas não entendi como o fato de ser um fenômeno complexo faz com que seja um erro englobá-lo sob um nome. Tal qual "homossexualidade", "sexualidade" também é um termo, ainda mais amplo, e que nem por isso não podemos tentar tecer considerações gerais a respeito. O mesmo se aplica a "bactérias", "isótopos", "franceses", etc.
o esclarecimento que ele traria não alcança aqueles que mais precisariam dele.
Não sei não. Conheço muitas pessoas que repensaram seus pontos de vista a partir do meu texto, do vídeo do Eli, de algumas coisas que tenta-se espalhar justamente na perspectiva de alcançar este público.
De qualquer modo dá para afirmar que a 'essência' do indivíduo manipulado se mantém em algum lugar puramente pelo modo como a mente funciona: os métodos existentes criam novas associações e condições mas a mente não é 'apagada' e associações prévias ou lembranças delas ainda estão lá, mesmo que as novas que exerçam influência prática.
O que você entende por "mente"? Este não é mais um conceito muito bem visto na Psicologia, por gerar muita confusão. A ideia de "mente" geralmente está associada a algo imaterial, quase transcendental, que "habita" o corpo da pessoa, mas não é o mesmo que seu corpo. Essa visão não faz sentido, por diversos motivos. O constructo “mente” traz mais questões insolúveis enquanto não acrescenta nada à explicação do fenômeno que se propõe a explicar.
Dentre estas questões está, entre outras, como pode algo não-físico interagir com algo
físico.
instintos e genes têm sua parte nos gêneros mas o como cada gênero funciona e é percebido é totalmente dependente da cultura.
Sim. Mas nem isso, nem nada do que disse, sustenta a afirmação de que a reorientação sexual não é possível.
kinn: Isso está num livro que detalha o caso e como a teoria da tabula rasa não funcionava. Não lembro de mais detalhes nem como prossegue o caso porque não li este livro todo (e é mais um dos que nem sequer lembro o título).
Acredito que você se refira ao livro "Tábula Rasa", do Steven Pinker.
Pinker se tornou uma referência de psicólogo para leigos, por ter sido muito divulgado pelo Richard Dawkins, seu amigo. Ele tem coisas não muito ruins, mas no geral fala uma quantidade de coisas erradas abissais para alguém que se diz cientista ou acadêmico, como aponto aqui:
http://pedro-sampaio.blogspot.com.br/2012/04/da-serie-charlatoes-intelectuais-parte.htmlSobre o caso que cita, desconheço fontes confiáveis sobre ele ter existido.
Esse caso é bastante para mostrar que certos tipos de princípios começam bem cedo na criança e ninguém pode tentar mudar.
Como digo no texto, dizer que um comportamento tem um elemento filogenético é redundante, não avança em nada na compreensão do comportamento, já que, se o organismo se comporta de determinada maneira é porque é biologicamente apto àquilo: um ser humano pode dedilhar cordas, mas não pode bater asas e voar, da mesma forma que um pato pode voar, mas não pode dedilhar cordas.
Agora, da mesma forma que é possível um organismo aprender a ter aversão à água (onde certamente existem contribuições genéticas para que ela não seja aversiva) e a gostar de limão (que certamente tem contribuições genéticas para que seja aversivo), não é ousado pensarmos que pode-se adquirir repulsa ao sexo ou a um gênero e, ainda mais especificamente, a um gênero no qual "naturalmente" você tenderia a sentir atração. Da mesma forma, podemos pensar que mesmo sem uma sensibilidade inata ao contato sexual com membros do mesmo gênero, isso pode-se tornar prazeroso.
Por isso a reorientação para mim parece uma espécie de lavagem cerebral. Pois ela tenta arrancar o core do self de onde está para onde o reorientador deseja.
Você apenas substitui "essência" por "core do self". Aponto essas coisas porque se não ficamos andando em círculos, reciclando conceitos já questionados.
Como disse, acho que entendo o que defende, mas basta dizer que acredita que seja desagradável para alguém adquirir aversão a algo que teria tendências naturais a gostar.
Muito complicado de investigar e discernir se dizem da boca pra fora, se estão condicionados a responder que estão curados ou se falam a verdade. Simplesmente não temos instrumentos para obter a verdade então temos que nos conformar com os relatos.
Voltando à tabula rasa, diversos outros experimentos foram feitos com bebê e detectaram que o bebê passa longe de ser uma tabula rasa.
Isso aí.
Barão: Como conciliar bissexualismo a monogamia? Não acredito que o posicionamento à escolha entre um sexo ou outro significa negar o self "core". Os homens, em geral, tem uma negação a monogamia, e este continua sendo o modelo de família, até mesmo para casais homossexuais.
Bom, é uma generalização bem grande acreditar que é inconciliável. O Cara pode ter atração por outras pessoas durante o casamento, daí até ele trair a mulher é outra história...
Assassinato e Estupro também são "naturais", ah medida que pessoas o cometem a pesar da sociedade e está relacionada a nossa "natureza", em muitos casos; assim como a noção de propriedade não é natural, e nem por isso saímos roubando por aí. Mas não significa que é irreconciliável. Podemos não ser uma tabula rasa, mas também não estamos escritos em pedra. Foi um dos pontos que o Sampaio salientou, muito do que fazemos como humanos é tentar superar nossa natureza estritamente animal, uma vez que a sociedade como um todo é formada por artificialidades.
Ótimos apontamentos.
Vale ressaltar que mesmo nossa "natureza" não é imune de contradições. Essa visão perfeitamente harmoniosa da natureza é ilusória (e religiosa). A seleção natural é cega e pode selecionar coisas bastante contraditórias. Os exemplos abundam, mas a questão da fidelidade
pode ser um deles, já que tanto a promiscuidade tem sua função (colocar minha sementinha em várias ou receber várias sementinhas, aumentando a chance de passar meus genes pra frente) quanto a monogamia (parceiros estáveis auxiliam no cuidado da cria, podem salvar sua vida em caso de perigos e adoecimentos, aumenta a chance de você não estar criando o filho de outro - logo, assegurando a sobrevivência de seus genes -, etc.).
Vincer: Se sucedemos em superar essa natureza animal que é o grande catch ao meu ver e onde podemos debater até o fim de nossas vidas sem chegar a uma resposta unânime. Até onde superamos realmente? Conseguimos ignorá-la, reprogramá-la, apenas contê-la? Quando 'conseguimos' conseguimos de fato ou apenas nos iludimos disso?
O problema é que você está entendendo por "natural" apenas aquilo com que nascemos. Mas, como disse o Eli Vieira em seu vídeo, isso é muito, muito pouco. É mais fácil evitar esse conceito. Simplifique imensamente suas ideias ao adotar apenas um raciocínio
selecionista.
O selecionismo nada mais é do que a aplicação do princípio da seleção natural (que é uma análise a nível filogenético, dizendo respeito à seleção de mutações gênicas de acordo com as
conseqüências que ela produz) a outros níveis de análise, como à ontogenia (seleção de comportamentos devido às suas conseqüências) e à cultura (seleção de práticas culturais de acordo com as conseqüências que produzem).
Pensando assim, existe uma base filogenética, mas quase nada do que fazemos (provavelmente apenas os nossos reflexos) é filogenético. Nem por isso o resultado é uma profunda contradição interna. Como exemplifiquei acima, duvido que achará um recém-nascido que goste de limão. Vai cuspir, fazer cara ruim e evitar a todo custo. No entanto, se você passa , com o tempo, a colocar um pouquinho de limão nas coisas, depois dar suco de limão com bastante açúcar, depois aos poucos ir diminuindo a quantidade de açúcar, et cetera, até chegar no limão puro em si, vai ocorrer algo que se chama
dessensibilização em relação ao azedo do limão e
emparelhamento do seu sabor com coisas prazerosas, como o açúcar outrora presente ou a atenção da mãe que incentivava e dos amigos impressionados.
Voilá, temos alguém que, contrariando sua natureza, gosta de chupar limão.
Sobre o sentimento de "conter" um impulso natural, temos de fazer isso diariamente para viver em sociedade: do nosso impulso de montar na mulher gostosa que passa na rua a não matar alguém que te deixou furioso. Temos de renunciar a muitos "impulsos" para viver em sociedade e, consequentemente, sobrevivermos enquanto indivíduos e espécie.
Como deixei claro em meu texto, acredito sim que no caso da homossexualidade isso tenha implicações bem mais severas do que neste e em outros exemplos, mas o ponto de "contrariar sua natureza" por si só simplesmente não é muito bom.