Ferdineidos: Depois que vi a justificação dele então, discordei mais ainda. Se você comparar crime ambiental com crimes de menor potencial ofensivo em uma análise meramente jurídica, o crime ambiental é mais reprimível que os crimes de menor potencial ofensivo, assim, não tem cabimento ele colocar a condenação em R$ 3.000 por equiparação à um crime ambiental.
Não entendi. Porque “em uma análise meramente jurídica”?
Bom, só pra restringir a discussão ao campo jurídico. Levando-se em conta o ordenamento jurídico brasileiro, o crime ambiental É mais reprimível que um crime de menor potencial ofensivo. Se alguém vier com Kant, Marx, Ana Maria Braga ou outras fontes de discussão, não afeta meu ponto.
Ferdineidos: Minha crítica na verdade é contra essa diferenciação entre Direito e Justiça. Entendo até certo ponto o que ele fala, mas prefiro ter um sistema rígido que não dá espaço pra loucuras do que a "humanização" do direito que acata os maiores absurdos.
Eu também preferiria. Mas não acho possível. Não há como fazer um sistema rígido e olha que isso foi tentado exaustivamente.
Não que eu ache que a liberdade de interpretação pode ser total, mas há um espaço para interpretação que nunca poderá ser ultrapassado.
Compartilho do pensamento que acha que o ordenamento jurídico é sim um sistema, informado por princípios e estes princípios devem nortear a interpretação das regras. Mas o que informa cada princípio nunca poderá ser totalmente especificado. Vamos sempre ficar na mão de termos bons juízes.
Senta que lá vem história
O nosso sistema é feito pra ser um sistema rígido, positivista. Já o common law é um sistema criado para ser fluido, pra se adequar à moral e personalidade da maioria (que chamam de sociedade). Falo isso pra dizer que nosso sistema É idealizado da forma que eu vejo como sendo correto. (Aqui eu falo de sistema, não das leis que o compõem).
Concordo com o que você diz sobre o ordenamento ter que ser visto como um sistema, e acho também que existem princípios que devem ser observados. Agora, eles devem ser observados no momento de aplicação da lei. Ele não pode ser utilizado quando na ausência desta para compelir alguém a fazer algo que não está estipulado.
Um exemplo disso é o caso colocado em outro tópico da indenização por abandono afetivo.
Pra haver uma indenização, tem que ter ocorrido um ilícito civil. Ilícito civil é quando a lei me obriga a fazer A e eu não faço A. Não existe obrigação legal para o pai amar o filho. Assim, não existe como encontrar ilícito civil aí.
No caso, não interessa se a conduta dele causou danos psíquicos ao filho. Não há ilícito cometido, logo não há direito a reparação.
A sentença por sua vez, "cria" o ilícito ao se basear nos princípios da "dignidade humana" e o "direito da criança de ser amada". Quando isso é criado, e pior, aceito como correto, passamos a ficar na mão daquilo que o julgador entende que está "subentendido", do que pode ser "interpretado" da norma, mesmo não tendo nada que explicitamente compele alguém a fazer algo.
Assim, basta uma interpretação para se criar deveres, responsabilidades.
As únicas formas que eu apóio a interpretação de princípios E sua aplicação direta são quando: estivermos debatendo a constitucionalidade de uma lei ou artigo (aqui acho inclusive que é essencial); houver omissão legislativa em caso de direito previsto na constituição (lendário "na forma da lei"); conflito direto entre duas leis; e lei obscura.
Mas independente de sistema mais fechado ou mais aberto, a qualidade dos juízes sempre é necessária
Ferdineidos: Direito não é a "busca por Justiça" como muita gente gostaria, isso é utopia. Direito em sua essência deve ser "paz social". É o contrato ao qual todos estamos sujeitos compulsoriamente ao viver em sociedade. Determinada lei te prejudica? Paciência, briga pra mudar a lei, mas não inventa teorias pra se esquivar da responsabilidade.
Respeito sua opinião, mas não concordo. O que você disse cabe muito bem para justificar regimes totalitários (não estou dizendo que você está fazendo isso).
Bom, eu queria dizer dentro de um estado democrático de direito. Acho que, inclusive, o objetivo da "paz social" é melhor caminho para se
evitar o totalitarismo.
Quando digo paz social me refiro ao equilíbrio entre todos os segmentos da sociedade (respeitando a isonomia), além das máximas "ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer nada, senão em virtude de lei" e "o estado só pode fazer aquilo que houver previsão legal".
Ao começar a ver o Direito como "justiça", existe o movimento de compensação da parte que se entende como coitada. Assim, pessoas que se caracterizariam como ofendidas tem regalias e tem princípios utilizados indiscriminadamente em seu favor, apenas para dar uma sensação de "justiça".
É o caso do acórdão que condenou o pai ao pagamento de indenização por abandono moral. Os desembargadores acharam um absurdo o pai não dar afeto pra criança, daí torceram alguns princípios pra penalizá-lo, mesmo que não exista lei que ampare.
Mas, como já disse, não é o caso das sentenças colocadas neste tópico, que estão, ao meu ver, tecnicamente corretas.
Ferdineidos: Aqui no Brasil se criou essa ideia que o Direito é algo superior, que tem que amparar as pessoas, trazer luz aos desafortunados. Em consequência, temos um sistema judiciário onde vale a pena ser safado e todo mundo é tratado como coitadinho, só se ferrando aquele que tá certo. Um exemplo disso é a falta de celeridade processual que todo mundo reclama.
Acho que você está generalizando muito. Muita gente certa se dá bem.
Cara, minha experiência (10 anos advogando) me dá uma certa confiança em dizer que, aqui no Rio de Janeiro, vale mais a pena ser safado do que correto, mesmo que o safado perca no final, ele normalmente já tirou lucro mais do que suficiente para compensar a perda final, e o correto no final só ganha depois de muita, muita briga.
Ferdineidos: Se os Tribunais, e principalmente o Supremo, utilizassem a Multa por litigância de má-fé com maior frequência (contra o praticamente 0 que se usa hoje), pode ter certeza que os Tribunais estariam menos cheios.
Verdade. Mas aí o problema não está na lei, está na sua aplicação.
Mas a aplicação é baseada no princípio da boa fé (a boa fé é presumida, a má fé tem que ser provada).
Assim, o cara entra com um Recurso Extraordinário cara de pau, onde se busca a rediscussão da matéria de mérito, baseado em dois princípios genéricos quaisquer (vedação ao enriquecimento sem causa é rei nesses casos), e ninguém dá má fé, por que não está provado que é recurso protelatório. O que o julgador quer? Uma confissão assinada por parte do advogado do recorrente? É só ler e ter meio cérebro que se percebe a intenção protelatória claramente.
Isso sem contar em embargos de declaração, de execução, impugnações, ou mesmo processos que são verdadeiras aventuras jurídicas, sem qualquer fundamentação.