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Expedição a Seraj Zatam (pt III)
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Tópico: Expedição a Seraj Zatam (pt III) (Lida 8839 vezes)
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Madrüga
Coordenação
Expedição a Seraj Zatam (pt III)
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Novembro 06, 2011, 09:21:43 pm »
Transplantando o projeto de conto lá do fórum antigo para cá. Quarta parte ainda em desenvolvimento (com medo de ficar grande demais).
PARTE I
Trabalhar no mercado de Leshbriz não é tarefa fácil. Claro, aqui não é Greimas, não temos tantas caravanas, mercadores, estrangeiros e afins, mas o mercado é grande. Até ouso dizer que é mais variado, já que nossos povos-irmãos do deserto nos trazem coisas pouco vistas nos bazares do sudeste... mas uma coisa é certa: nosso mercado não deixa de ser igualmente perigoso.
Meu nome é Vlatan, e trabalho como “recuperador” no mercado de Leishbriz. Os recuperadores são, na realidade, um bando de pessoas que correm muito, conhecem bem os corredores da cidade e são capazes de proteger os mercadores do maior terror que assola nosso bazar: os moleques de rua.
Hoje tenho um bom ordenado e me orgulho de fazer bem meu trabalho sem, no entanto, ferir as crianças (que, afinal, não roubam porque querem). Meu setor no mercado tem uma das menores quantidades de roubos por mês, e muitos dos mercadores, satisfeitos, ocasionalmente me presenteiam ou chegam a dar polpudas gorjetas. A guilda que organizamos para agregar os recuperadores não proíbe receber presentes e, já que dividimos igualmente as peças de prata que os mercadores dão semanalmente para pagar nossos serviços, ninguém tem ciúme ou inveja do dinheiro alheio.
E foi justamente em um dia que parecia comum que uma coisa horrível aconteceu: enquanto eu lançava minha boleadeira para pegar um ladrãozinho, um crime mais sério aconteceu no outro lado do meu território. Um roubo misterioso acabou em morte, deixando uma tenda revirada, objetos quebrados e duas crianças à míngua, chorando a perda dos pais.
Quando a coisa é mais séria, chamamos a Palma Escarlate. Alguns poucos membros da Ordem andam pelo mercado diariamente, principalmente à procura de hereges, artefatos importantes, tráfico e outras coisas. Ainda contando com a existência de uma pequena milícia na cidade, alguns se perguntam por que diabos os recuperadores existem, mas eu respondo: ninguém dá conta de tantos pequenos roubos, assaltos e brigas no mercado. Nem nós conseguimos, nosso trabalho é só minimizar as perdas.
A dupla mais conhecida do mercado de Leishbriz era composta de Azgriz e Nojkref, dois soldados de aparência simples, mas imponente: Azgriz era o mais inteligente da dupla, o que tinha o melhor posto e, interessantemente, o que tinha o melhor coração. Eu mesmo já vi muitas situações serem resolvidas “fora das leis” por ele, sempre visando o bem dos envolvidos, e isso contrasta com duas coisas: a extensão das habilidades dele (ele conseguiu certa vez, juro pelo Uno, paralisar um bandido falando uma língua esquecida... depois calmamente andou e prendeu grilhões nele) e, estranhamente, com o mau-caratismo de Noj.
Nojkref era um exemplo de tudo que é ruim na Ordem da Palma Escarlate: um sujeitinho pouco inteligente, mas completamente vil, dado a extorsões, aceitar subornos, abusar da autoridade, maltratar quem roubava para comer, e daí para baixo. É estranho notar que, pelo menos no meu ponto de vista, as pessoas realmente ruins mas com o mínimo de inteligência fazem um esforço para tentar ser cordiais, usando isso para seus fins escusos. Noj, em toda sua ignorância, fazia o oposto: era um sujeito intragável, indesejado e, por causa de sua posição, temido na cidade.
Voltando ao assalto com morte, era uma coisa rara no mercado, e todos estavam meio chocados. Quando Azgriz e Noj apareceram, já foram afastando os curiosos que se amontoavam em volta, um deles soou uma corneta característica e chamou outros companheiros, provavelmente com perfis mais investigativos. Quanto a mim, fiquei culpado por ter falhado: mal vi o que aconteceu, perdi o assalto, o assassinato, nem sei ao certo como tudo ocorreu. Ao ver as crianças chorando, só uma coisa me veio à mente: eu tinha que levá-las de volta para casa, fosse onde fosse. Pelas roupas e pelas mercadorias, eles eram de Seraj Zatam, o que era duplamente complicado.
Logo após Azgriz e seus colegas interrogarem as crianças, ficou claro que eles simplesmente deixariam os órfãos ali e investigariam o crime, que parecia mais importante. Meu coração estava partido. Chamei Azgriz de lado e disse:
– Não posso ver esses dois virarem mendigos aqui, igual essa molecada que vive de roubar o mercado. Ainda mais branquinhos desse jeito, vão ficar marcados logo de cara. Azgriz, pode levar o tempo que levar, Seraj Zatam não é longe, mas eu vou levar essas crianças para casa.
O soldado parecia pensativo. Talvez eu tivesse mexido com a boa natureza dele.
– Vlatan... acho que você tem razão. Mas você não chegaria na metade do caminho. Salteadores, goblins de Kotrug, animais selvagens. Vou falar com meu superior, vou com você.
Nojkref se virou ao ouvir essas palavras, por mais que estivesse um pouco distante. Um olhar meio raivoso passava pelo rosto dele, e parecia direcionado a mim.
PARTE II
Azgriz falava a língua das crianças, o que me deixou despreocupado. Ele parecia tê-las acalmado (na medida do possível), e descobriu que eles tinham outros familiares lá em Seraj Zatam. Para disfarçar o nervosismo, fui colher uns ramos de verbena-azul nos arredores do portão do mercado. Quando voltei, já colocando os ramos nas botas, ofereci alguns para Azgriz, que me agradeceu polidamente. Enquanto ele colocava os ramos dentro dos sapatos das crianças também, ofereci alguns para Nojkref, que os recusou com um resmungo qualquer. Aparentemente, esse homem horrível não tinha medo nenhum dos espíritos das estradas.
Tudo parecia um sonho, um delírio esquisito: sabe quando as coisas vão acontecendo e você não tem controle sobre nada? Foi assim, por exemplo, quando Nojkref conduziu a prece de despedida: eu percebi que, por pior que fosse minha impressão dele, ele era da Palma Escarlate e, portanto, um devoto fervoroso do Uno. Isso me chocou, mas foi um pouco reconfortante.
E foi nesse clima de delírio que empreendemos a viagem. Não eram muitos dias, os tricerontes que puxavam a carroça eram fortes e tínhamos muitos víveres. Dessa forma, a primeira travessia pelo “quase-deserto” de Pehelnaur só contava com a paisagem: sol forte, ventos secos, muitos arbustos rasteiros e pequenas árvores. Azgriz era um poço de paciência, e tentava mostrar tudo aquilo às crianças ao mesmo tempo em que acalmava Nojkref e me ensinava também algumas coisas.
Entre os lagartos que comumente rondam Pehelnaur, tivemos a chance de ver um deles, ao longe, em toda sua majestade: o dragão do deserto. Recostado em uma rocha, provavelmente absorvendo calor, a besta vigiava com olhos astutos. Nojkref nos alertou para não encarar demais o animal, pois é sabido que muitos deles percorrem grandes distâncias apenas para defender seus territórios. Com uma mistura de medo e admiração, continuei olhando de canto de olho para o dragão, torcendo para nada acontecer.
Nossa rota era meio tortuosa, e passava por alguns canais secos de rios. Eu sabia do perigo desses canais: por vezes, uma chuva passageira (porém intensa) caía em algumas partes de Pehelnaur, e esses canais rapidamente se enchiam e criavam uma correnteza violenta. Havia alguns avisos na cidade para que essas rotas fossem evitadas. Perto delas, vários animais como lebres e coiotes faziam moradias ou pareciam simplesmente congregar.
No decorrer da viagem, parecia que eu estava conhecendo melhor meus companheiros: lá pelo terceiro dia, Azgriz e eu falávamos de Nojkref, que tinha ido caçar algumas lebres, e novamente fiquei surpreso com o que descobri.
– Noj não é necessariamente um homem ruim, Vlatan – Azgriz fitava o horizonte, pensativo – Mas é que a vida na Palma Escarlate não é fácil. Fere, marca uma pessoa, e uns lidam mais com isso do que outros.
Eu mal respondia, morto de curiosidade. Mas o inquisidor parecia ler meus pensamentos, completando minhas frases:
– Eu imagino, Az, mas é que não consigo entender como...
– Uns dez anos atrás, Nojkref era simplesmente um recruta, um novato na ordem. Devia ter uns dezoito, dezenove anos. Ele entrou na Ordem pouco antes do irmão mais novo, Sigruv. Em uma das primeiras missões de ambos, um erro da equipe acabou em tragédia, e todos foram mortos. Óbvio que Nojkref sobreviveu, mas a maior parte das cicatrizes dele vêm daí. Ele ficou meses em coma, porque nem a cura divina dos clérigos conseguiu fazê-lo acordar. Quase o demos como morto.
Aquilo me embrulhou um pouco o estômago. Eu tinha família também, perder alguém desse modo feriria qualquer um. E dessa forma, tão cruel, era um espinho no pé, como dizíamos na cidade: entra fundo, machuca muito e não dá pra esquecer.
– Era a única pessoa que ele tinha, Vlatan. Consegue imaginar isso? Eu também não. Ele não teve força suficiente para aguentar, acabou ficando meio amargo, meio cínico. Você pode achar que ele não quer levar as crianças para Seraj Zatam, mas no fundo ele entende como elas se sentem. E ele só sobreviveu, entretanto, por conta de uma decisão muito difícil, do tipo que os membros da Palma sempre devem...
O assobio estridente de Nojkref nos interrompeu. Ele vinha de trás de uma colina rochosa, segurando quatro lebres. E, com a maior naturalidade do mundo, enquanto começava a preparar a fogueira, ele disse:
– Percebi umas trilhas esquisitas lá na frente da estrada. Tem uma mais do que óbvia emboscada goblin nos esperando, então é melhor tomarmos as devidas medidas.
Emboscada goblin? E ele reagia assim, como se fosse um mergulho no lago? Meu sangue gelou de tal forma que mal senti o gosto das lebres depois.
PARTE III
O som furioso do Madrag ainda ecoava quando chegamos na região que circunda Sibram. Lá o deserto começa a adquirir um contorno único, mais rochoso e cheio de pequenos vales e desfiladeiros. Nojkref resmungava da falta de criatividade dos goblins de Kotrug, que pareciam se esconder sempre no mesmo tipo de lugar, executar emboscadas parecidas e tediosas. Azgriz me dava algumas orientações, pois mesmo que os goblins fossem uns "parvos" (no dizer de Noj), precisaríamos proteger as crianças e evitar que elas sofressem qualquer dano.
Assim que começamos a nos direcionar ao despenhadeiro onde Nojkref encontrou as pistas da cilada kotroi, colocamos as crianças dentro do maior baú, deixando uma porção de roupas e cobertores espalhados pela caravana. Azgriz as tranquilizou e me deu as últimas dicas:
– Na verdade é muito simples, Vlatan. Eles vão apontar arcos, azagaias ou bestas para nós. Geralmente são só dois com esse tipo de arma, para fazer a cobertura, por isso que é importante eu estar de um lado e você do outro. Noj fica no meio, fazendo o papel de líder da caravana. Aí os vermes vão chegar perto para fazer o saque, e vão tentar matar todo mundo à traição depois. Eu nunca entendi por que raios eles não atacam de uma vez, mas é o jogo deles.
Depois de assumirmos nossos postos e andar por um tempo, o primeiro indício: uma flecha cortou o ar, zunindo, e bateu direto no flanco de um triceronte. De um modo meio canhestro, até engraçado, ela caiu no chão e o paquiderme olhou de lado, como se um marimbondo tivesse acabado de picar seu couro. Os gritos aí já eram inconfundíveis, e Nojkref puxou os arreios com um resmungo.
Das rochas que se erguiam de ambos os lados da estrada, cinco goblins apareceram, e eu confesso que estremeci: sujos, fedendo de longe, vestidos com trapos e restos de armaduras enferrujadas, dois deles apontavam arcos para nós (e aqui eu ouvi Azgriz dizer "pff", pouco surpreso) enquanto os outros três desciam a gritavam todo tipo de coisa na língua deles.
Enquanto Noj colocava seu machado no chão, ele começou a responder aos goblins, na língua deles. E foi nesse átimo, nesse mínimo momento de surpresa deles que Azgriz gritou algo que eu nunca entendi:
– Zapre!
Entendendo que esse era o sinal, eu rapidamente saquei minhas boleadeiras e atirei no goblin que estava mais para o meu lado. O resto aconteceu tão rápido que explicar não dá uma boa ideia da cena: gritando dessa forma (e confirmando aquilo que eu já tinha visto), Azgriz meio que deixou um arqueiro parado, gelado de medo; o outro arqueiro já estava caindo do barranco, enredado na minha boleadeira; e, com uma ferocidade difícil de descrever, Nojkref estava esmurrando os outros goblins. Sem brincadeira: esmurrando. Às vezes ouvimos que alguma caravana foi atacada por goblins, mesmo com mercenários para proteger os mercadores... e lá estava Noj, acabando com a raça daqueles macacos esverdeados sem usar arma nenhuma.
Tendo ainda o estômago de queimar os corpos ("para não sobrar nem cheiro desses animais imundos"), Nojkref limpou as mãos e deu de ombros. Azgriz nem mencionou o incidente para as crianças, que acharam aquilo tudo uma grande brincadeira. Nós rimos com elas e seguimos viagem.
Foi até engraçado que talvez esse fracasso da emboscada tenha desanimado os ladrões, goblins e outros perigos do deserto, pois os dias seguintes foram passando sem grandes incidentes. O menino (e aqui cabe dizer os nomes das crianças: a menina se chama Zalish e o menino, Tulan) teve um acesso de febre que pôs à prova tanto as habilidades de Azgriz com as ervas do deserto quanto a nossa paciência. Achei estranho, a princípio, Nojkref não se zangar com os escândalos do moleque, mas depois que vi que ele estava fazendo amizade com Zalish (ele até deixava que ela montasse os tricerontes quando tínhamos certeza de que não havia perigos à vista), eu já não duvidava de mais nada.
O ar já começava a ficar mais frio e úmido quando finalmente nos demos conta (mesmo que o horizonte já estivesse mostrando há muito tempo): estávamos chegando ao pé das montanhas de Seraj Zatam. Eu, que nunca tinha estado nessas terras, rapidamente me cobri com uma manta... mas não era frio o que eu sentia.
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Última modificação: Março 06, 2015, 10:21:55 pm por Madrüga
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"If there are ten thousand medieval peasants who create vampires by believing them real, there may be one -- probably a child -- who will imagine the stake necessary to kill it. But a stake is only stupid wood; the mind is the mallet which drives it home."
-- Stephen King,
It
(p. 916)
Led
[Coordenação]
eita
Re:Expedição a Seraj Zatam (pt III)
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Resposta #1 Online:
Março 02, 2015, 07:59:13 am »
ONDE TÁ O RESTO GENTE PLMDDS
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