Autor Tópico: Antropomorfismos  (Lida 1573 vezes)

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Antropomorfismos
« Online: Dezembro 16, 2012, 02:44:52 am »
Encerrado em jaula robusta
o minotauro permanecia imóvel
enquanto espreitava com orbes escuros
a farisaica corte ao seu redor.
Por toda sorte de mãos correu lacrado o veredito.
Ouviu-se apenas o especular sussurral do público
e o bufar trôpego de um monstro feito réu
quando cortou a noite:
“Culpado!”, vociferou-se,
o dedo julgador em riste
disseminou na multidão espírito de júbilo vingador.
Da bruta criatura talvez lembrem,
quem sabe, os da turba mais próximos,
que compreendeu o anúncio de sua morte,
pois, ainda que estóica,
debarrou uma lágrima antes que lhe viesse o carrasco,
antes que a acha subisse à lua,
disseminando furor e sede sanguinária
entre as gargantas roucas das arquibancadas
para as quais não importa o crime, e sim a sentença.
Produto de maldições divinas,
a boçal e bovina fronte escondia atrás de memórias de fogo
pesares e sonhos de marfim.
A lâmina dividi-lo-ia vorazmente em dois,
corpo humano,
cabeça taurina,
extinguindo eternamente a evidência terrena
de sua existência mitológica.
Após sua morte, talvez tenha encontrado paz,
já que nesta vida fora um homem entre bois,
e um boi entre homens.

Re:Antropomorfismos
« Resposta #1 Online: Dezembro 16, 2012, 02:49:05 am »
Esse poema, de abril desse ano, é a versão atual dada a um microconto que havia publicado em 2007 na Spell. Na época, lembro de ter sido bem recebido, embora li que o conto era curto. Para um concurso, transformei-o em uma poesia e considero essa atual forma mais sincera para o que já era um poema em prosa.