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Fim do almoço grátis no BrasilEm 10 de outubro, o Banco Central do Brasil cortou sua taxa de juro básica pela décima vez em pouco mais de um ano, para 7,25%. A medida surpreendeu os analistas, pois os juros já estavam historicamente baixos e a inflação, acima do centro da meta do Comitê de Política Monetária, de 2,5-6,5%. Nem o crescimento econômico anêmico, que provavelmente terminará este ano em 1,5%, nem a moeda, que tende a subir com os juros enquanto se acumulam os investidores estrangeiros em busca de retornos, supostamente influirão em suas deliberações. Mas hoje a maioria dos analistas acredita que suas decisões são tomadas com vistas a aumentar o crescimento e enfraquecer a moeda, e que a menos que a inflação ameace romper a barreira dos 6,5% os juros continuarão baixos por algum tempo.Por enquanto, a demanda global contida significa que é improvável que a inflação escape da coleira. Mas em longo prazo o governo terá de conter os gastos públicos e aplicar reformas difíceis se quiser que o Brasil cresça mais que 3 a 4% ao ano sem alimentar a inflação. Medidas recentes para cortar os impostos em folha de pagamento, limitar os aumentos de salários do setor público, reduzir os custos da energia e melhorar a péssima infraestrutura de transportes deverão ajudar a aumentar esses limites de velocidade econômica claramente modestos. Elas também convenceram muitos de que a presidente Dilma Rousseff fará o que for necessário para evitar que o banco tenha de aumentar de novo.Taxas de juros permanentemente mais baixas seriam o mais positivo avanço econômico no Brasil desde que a hiperinflação foi dominada quase 20 anos atrás, diz Enestor dos Santos do BBVA, um banco espanhol ativo na região. As firmas investiriam mais — e ter um retorno decente significaria financiar projetos produtivos, não apenas estacionar dinheiro em títulos do governo.Retornos ao credorMas em alguns setores os lucros estão caindo. Quando os investidores perceberam que as firmas de eletricidade teriam de aceitar retornos muito mais baixos a partir do início do próximo ano, ou ficar inelegíveis para se candidatar a concessões que terminam entre 2015 e 2017, os preços das ações despencaram. Masha Gordon, da administradora de fundos PIMCO, elogia o governo por tapar os ouvidos para interesses escusos e declarar o fim do “almoço grátis” no Brasil. As concessionárias de pedágios rodoviários e de energia que assinaram acordos quando os juros estavam muito mais altos se beneficiaram enormemente quando eles caíram, ela indica, deixando alguns projetos de baixo risco com retornos reais próximos de 20%. Dificilmente se poderia esperar que isso durasse.Mas são os bancos que terão de se esforçar para se adaptar ao novo ambiente de juros baixos no Brasil, diz Gordon. Suas margens líquidas de juros vêm caindo há anos enquanto as taxas que cobram sobre empréstimos caem juntamente com a taxa básica, e o espaço para cortar os juros que eles oferecem sobre reduções de depósitos. Isso comeu os retornos. A pressão sobre os lucros aumentou recentemente enquanto o governo pressionou os bancos a transferir para os clientes os juros menores.Os dois grandes bancos controlados pelo Estado, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil, cortaram os juros a pedido do governo. Os bancos privados tiveram de acompanhá-los ou perderiam participação de mercado. Segundo a Anefac, uma organização de contabilistas, a taxa média paga pelos mutuários brasileiros no varejo em setembro caiu abaixo de 100% pela primeira vez. As taxas para empréstimos empresariais também estão no menor nível histórico — 48% ao ano.Pelos padrões brasileiros, esses juros podem ser baixos; pelos internacionais, dão água na boca. O maior motivo, segundo Sergio Furio da bankFacil, uma startup que oferece informações online sobre finanças ao consumidor, é a ineficácia dos bancos brasileiros. Embora suas receitas por funcionário estejam amplamente de acordo com outras grandes economias, sua baixa produtividade é mascarada por preços muito altos. Elas precisam de duas vezes mais pessoal para gerar os mesmos volumes que os bancos da Europa ou dos EUA, ele indica — mas ainda são rentáveis porque as margens também são duas ou três vezes maiores.“Os bancos brasileiros vêm contando com o último sopro das taxas de juros escandalosas”, diz Furio. Em vez disso, eles deveriam tentar ser mais eficientes e atrair um tipo melhor de clientes. Os empréstimos de alto custo afastam as pessoas abastadas que poderiam ser confiáveis para repagá-los. Essa seleção adversa significa que as taxas de juros devem ser aumentadas ainda mais para cobrir as frequentes inadimplências. O bankFacil espera ganhar dinheiro rompendo esse ciclo, enviando usuários recém-educados e dignos de crédito para instituições financeiras que podem cobrar menos deles.As mais altas taxas de juros estão nos cartões de crédito, que no Brasil são principalmente usados para comprar produtos em prestações “sem juros”. Os comerciantes oferecem planos de pagamento autofinanciados de até 18 meses. Eles escondem seus custos financeiros no preço da etiqueta e só recebem pagamentos mensais da emissora do cartão do cliente. Os bancos ganham pouco com esse peculiar “crédito sobre crédito”, que forma 70% do total dos empréstimos em cartão de crédito no Brasil. Somente quando um detentor de cartão perde um pagamento a emissora finalmente pode cobrar juros. Mas a probabilidade de inadimplência entre esses pagadores é de 28%, o que significa que os juros têm de ser astronômicos para que os bancos tenham algum lucro.No mês passado o Itaú Unibanco, maior banco brasileiro de controle privado, informou que gostaria de pôr fim ao uso dos cartões de créditos dessa maneira. Mas o governo teme que os consumidores brasileiros estejam tão habituados a pagar por tudo, de roupas a eletrodomésticos ou carros, em prestações supostamente sem juros que poderiam parar de gastar totalmente, cortando na origem uma nascente recuperação. Qualquer medida terá de ser gradual.A boa notícia é que os bancos brasileiros têm muita gordura para cortar antes de chegarem ao osso. Eles também adquiriram muitos novos clientes na última década, diz Franklin Santarelli da Fitch Ratings, um processo caro que deverá dar recompensas durante a próxima. O Brasil está “apenas entrando na corrente dominante”, diz Ceres Lisboa da Moody’s, outra agência de classificação. Seus bancos, como os de outros lugares, precisam descobrir como ganhar dinheiro com margens menores e volumes maiores.