Qual é o grau de fantástico que você quer para o seu cenário? Que os personagens já comecem num nível próximo ao épico e que já possam levar a cabo grandes feitos?
Ultimamente, justamente por causa das coisas que andei lendo, tomei um certo gostinho pelo "realismo fantástico". Acho que dá pra você conservar, ao mesmo tempo, o fantástico, e o realista.
Como?
Imagino que o contexto histórico deva ser realista: os valores, a tecnologia, o conhecimento sobre o mundo, a "religião". Claro, isso deve ser mantido na medida, pra que ninguém fique neurótico tentando apontar incongruências históricas. Mas, já que você está se dedicando a construir esse cenário, talvez seja o caso de dar um lida em um ou outro livrinho. Pra esse contexto eu recomendo "História Ilustrada da Grécia Antiga", do Paul Cartledge, da Editora Ediouro. Apesar de ser um nome bem parecido aos desses livros oportunistas, ele é muito bom, e bem acurado historicamente. Através dele você pode incorporar vários elementos da cultura helênica, pra dar mais cor local pra aventura: os costumes, as crenças, o funcionamento da sociedade. De qualquer forma, eu sou a favor de levar em conta tudo isso desde que haja um grau de flexibilidade, porque seria realmente impossível narrar e interpretar com uma precisão histórica total.
O outro que eu recomendo é o "Histórias", do Heródoto. É grande. Não precisa ler inteiro. Mas é interessante justamente pra você perceber a maneira com que os gregos enxergavam os outros povos, vizinhos, ou povos mais distantes. E acho que é na inscrição dessa memória coletiva dos gregos que você pode encontrar um elemento fantástico. Tem um livro do Paul Veyne que se chama "Acreditavam os Gregos em seus mitos?" Resumindo, a conclusão dele é de que os gregos acreditavam tanto quanto nós acreditamos no Papai Noel: num sentido mais pedagógico. Uma vez que os mitos estão sempre acontecendo (eles são as constelações, as estrelas que estão sempre no céu), eles envolvem uma temporalidade diferente. Acho que o fantástico pode ser explorado justamente aí: os personagens têm conhecimento dos deuses e dos heróis, mas a presença deles não é abundante no mundo, e pode até, ser duvidada. Então o fantástico aparece enquanto possibilidade e recurso narrativo. Acho que seria interessante que os personagens travassem contato com criaturas fantásticas, ou com heróis, ou com certos rituais e feitiçarias, mas de uma maneira bem dosada. Aliás, se eles mesmos fossem se tornando heróis ao longo da aventura seria ainda mais interessante.
Mas isso envolve outro problema: em que época você quer situar a sua história? A distinção "oficial" dos historiadores divide a Grécia em pelo menos 3 ou 4 fases. A "fase mítica" anterior a 1200 a.C (que não sabemos se existe de verdade, mas é a época sobre a qual falam os poetas, como Homero e Hesíodo, e quando pode ter acontecido a Guerra de Tróia), a "fase das trevas", que vai de 1200 a, se não me engano, 800 ou 600 a.C e que leva esse nome por conta esse nome por conta da escassez de documentos, e que remonta às raízes minóicas, a fase clássica, de 400 a.C, onde aparece a filosofia, e tudo o mais que a gente conhece, e a fase em seguida em que eles são dominados pelos macedônios. Acho que se você quer mais elementos fantásticos, deve inserir sua campanha na fase mítica. O interessante é que o mito das origens gregos também divide o tempo em várias fases, correspondentes aos metais. Acho que o ouro é o primeiro, depois vem o bronze, mas, resumindo, é um processo de "humanização", porque primeiro vêm os deuses, depois os heróis, depois os homens. Acho que talvez sua história se situasse entre os heróis e entre os homens. O problema é que aí você abriria mão de fazer referência aos eventos históricos, pra trabalhar mais com a mitologia. Acho que um imbricamento entre os dois seria o ideal.
Andei pensando aqui e acho que um bom esquema seria você trabalhar as ilhas, de maneira semelhante à que fez Homero na Odisseia. Acho que dá pra você considerar a enorme quantidade de ilhas ali no Mar Egeu como espaços para o mistério e o fantástico. Além de darem uma liberdade enorme, uma campanha que lida com ilhas pressupõe sempre movimento e ganchos fáceis.