Autor Tópico: Conan 2 - Agrilhoado  (Lida 1488 vezes)

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Conan 2 - Agrilhoado
« Online: Janeiro 16, 2015, 05:05:59 pm »
Nos porões do castelo de Zhenkri, Rei da cidade de Athros, Conan está preso. Acorrentado contra a parede, o bárbaro já perdeu a noção do tempo decorrido desde sua captura. Mesmo na masmorra úmida e fétida, as feridas do combate feroz contra os soldados estão cicatrizadas. Os guardas daquele buraco lhe lançam olhares de ódio. Um deles, em especial, parece carregar especial rancor. Acompanhado por outros dois, o soldado esmurra o rosto de Conan repetidas vezes.
- Então, bárbaro maldito? Apreciando a hospitalidade de Zhenkri?
– Cão! Tire essas correntes e eu lhe mostro o que penso de Zhenkri e dos covardes sobre quem ele reina.
– Que sabe você de covardia? Decapitou um capitão à traição, em uma luta de mãos nuas.
– Seu capitão pediu a espada a um dos soldados para me apunhalar. Eu apenas a tomei e entreguei-a de um modo que ele não gostou.
– Está zombando da morte de Dinak? Aquele homem me devia. Ia me tirar daqui.
– Na Ciméria os homens não esperam que outros homens tornem suas vidas mais fáceis.
A resposta vem na forma de mais um golpe. Os lábios de Conan sangram. Em silêncio, enquanto é levado da cela, Conan sentencia Plácido à morte.
****
Conan é conduzido acorrentado por longos corredores. Quanto mais avança, mais suntuoso o ambiente se torna. Na sala do trono, nobres reunidos em pequenos grupos conspiram. O estrépito das maciças portas de madeira sendo fechadas é o sinal para que o silêncio se estabeleça. Conduzido por três guardas, Plácido entre eles, Conan adentra o recinto.
Pouco afeito às lidas da corte, é o próprio Rei Zhenkri quem enumera os crimes de Conan.
- Conan da Ciméria, está aqui para ser julgado por seus muitos crimes. Segundo Baldas, membro da guarda, você foi responsável direto pela morte de soldados de Athros. E pela morte de outros três, enviados para capturá-lo. Assassinar aqueles que protegem as muralhas da minha cidade é um crime intolerável, e por ele o condeno à morte pela forca. Tem algo a dizer a seu favor, Conan?
– Pouco sei a respeito dos costumes dos homens civilizados, mas esperava que alguém como o Rei Zhenkri, que tomou o trono pisoteando o crânio daqueles que eram fracos demais para manter o poder, entenderia as necessidades de um homem no campo de batalha.
As palavras geram desconforto entre os nobres perfumados. O modo como Zhenkri humilhou tradições e trespassou com sua espada os costumes ainda não foi de todo superado.
- Maneja as palavras melhor do que eu esperava, cimério. Mas não tão bem a ponto de fazer com que Zhenkri volte atrás em sua decisão. A forca é seu destino.
Neste momento, o conselheiro-emérito do rei, de nome Athicus, adianta-se e pede a palavra.
- Magnânimo Rei Zhenkri, nenhum dos aqui presentes ousaria questionar sua decisão. Entretanto, olhe para este bárbaro. Sua ferocidade deu cabo de três de nossos melhores homens. Estavam eles a cavalo, de armadura, espada e escudo. E esse cimério lutou com uma adaga. Apenas após um combate feroz pôde ser dominado pelos quatro cavaleiros restantes. Não lhe parece, magnânimo, que esse é o tipo de homem que precisamos nas nossas fileiras na investida contra Polopponi? O crime do Conan é imperdoável, mas sua majestade, que também se criou coberto do sangue dos inimigos, não considera que aproveitar a força desse cimério, fazendo-o lutar por Athros, não é a punição mais justa a ser dada a um guerreiro?
Zhenkri ouve com atenção. Ao final da exposição de Athicus, procura nos olhos dos presentes o efeito das palavras do conselheiro. Por fim, decreta.
- Conan da Ciméria, sua sentença é a morte. Morrerá no campo de batalha, lutando por Athros, como fariam aqueles cuja vida você tirou.
****
A madrugada é silenciosa nas masmorras. Aqueles que já esqueceram como é a vida além das grades sabem que gemer e lamentar apenas convida à fúria guardas impiedosos. Não são súplicas que atraem o olhar de Conan, mas o bruxulear de uma tocha. Nas mãos de um assustado pajem, a chama tremula mais do que o normal. O jovem acompanha Athicus, conselheiro-emérito de Zhenkri.
- Me perguntava quando viria cobrar pelas suas belas palavras na sala do trono.
– É astuto, para um selvagem. Mas não tem em seu poder nada que eu queira, bárbaro.
– Do que se trata, então?
– Sei que esteve recentemente em contato com um estrangeiro do oeste. Asketh.
– Ele está morto.
– Não me importa ele, e sim algo que há em sua casa. Um medalhão.
– Feitiçaria!
– Algo assim. Nada que sua mente rudimentar possa compreender. Sei que esteve lá. Quero que volte esta noite e me traga o medalhão. Asketh o escondia em um porão.
– Não sei de porão nenhum. E estou cansado de fazer acordos com feiticeiros.
– Que opções têm você? Apodrecer aqui para sempre, ser apunhalado por um dos guardas, ou morto no campo de batalha, conforme a sentença de Zhenkri. Nenhuma delas melhor do que o que ofereço.
– Como pode saber que não fugirei na primeira oportunidade?
– Porque mesmo um selvagem como você é capaz de respeitar a própria palavra. E porque, caso me traia, eu tomarei o cuidado para que seja a última coisa que fará.
– Pois bem, me solte eu lhe trago o tal medalhão.
– Em uma hora alguém abrirá a cela e deixará o caminho livre até a saída. Não se desvie, retorne o mais rápido que puder, e não sofrerá mal algum. Eu ficarei em dívida com você e, quem sabe, possa favorecê-lo ainda mais aos olhos do rei.
Antes de deixar a masmorra, Athicus ordena que Plácido destranque a cela do bárbaro e deixe livre o seu caminho. Diante da contrariedade do soldado, Athicus mal contém sua fúria. Sugere, por fim, que Plácido acompanhe Conan discretamente. Se o fizer sem erros, poderá conquistar um aliado muito mais importante do que um mero capitão da guarda.
****
Assim que deixa as imediações do palácio de Zhenkri para mergulhar na madrugada de Athros, Conan dirige-se até a taverna onde hospedou-se durante o breve momento de tranquilidade desfrutado na cidade. Valiatti, o proprietário, concorda em guardar o fruto de uma possível pilhagem. O taverneiro cede uma velha espada a Conan, afinal, “nunca ouvi falar de um trabalho na madrugada que rendesse muito ouro sem a necessidade de uma lâmina”.
A caminho da residência de Asketh, o cimério percebe que alguém acompanha os seus passos. Esgueirando-se pelas sombras de uma rua vazia, Conan vê a aproximação de Plácido, que perde sua pista por um instante. Porém, a lâmina da espada recém-adquirida reflete a luz de uma tocha distante. É o suficiente para que o soldado recue e evite o ataque de Conan, que sai das sombras em uma investida mortal. Antes que possa sacar sua arma, Plácido é dominado pelo bárbaro. Com o aço contra a garganta, o soldado nada pode fazer além de colaborar.
- Que faz atrás de mim, cão? Foi aquele maldito Athicus que o mandou?
– Sim!
– Acaso ele pensa que vou precisar de sua ajuda?
– Não sei o que pensam os nobres. Por mim, você morreria na masmorra.
– Até que tem coragem, especialmente para alguém com uma espada no pescoço…
– Só preciso acompanhá-lo e garantir que tudo dê certo. Se eu falhar, serei morto. Pode ser agora, por você, ou mais tarde, por algum feitiço de Athicus. Não faz diferença.
– Se apenas precisa me acompanhar, que assim seja. Apenas não fique no meu caminho. Vi objetos que poderiam comprar cidades inteiras na casa de Asketh. Quem sabe algo lá sirva para que você deixe de obedecer a ordens de reis e feiticeiros.
Antes que sua conversa desperte atenção indesejável, os dois partem juntos até a residência de Asketh.
****
Enquanto Plácido observa, Conan usa da agilidade adquirida nas montanhas da Ciméria para escalar uma parede e atingir altura que lhe permita observar o pátio da residência de Asketh. Não há sinal de guardas, e a única iluminação vem de uma tocha ao lado da porta principal, que se encontra entreaberta.
Saltando em silêncio até o gramado, Conan vasculha a construção em busca de uma entrada externa para o porão que Athicus afirmou existir. Sem indícios, estende a averiguação para o interior do palacete. Seu intento é interrompido pelos ruídos produzidos por Plácido, que sofregamente escala o muro que separa a área interna da rua.
Antes que consiga repreender o soldado, Conan é acometido por fortes dores no abdômen, como se uma adaga em chamas lhe penetrasse as entranhas. Ainda aturdido, e desconfiado da comida que recebeu na prisão, o bárbaro ordena que Plácido faça silêncio, enquanto se dirige até a entrada da residência.
Além das portas, jaz um corpo. Trata-se de um dos guardas de Asketh. Uma ferida na nuca ainda vertendo sangue denuncia a morte recente. Conan barra a porta para garantir que o assassino não tenha rota fácil de fuga.
- Sua saída passa por mim, cão!
Avançando na direção da sala onde Asketh o recebeu, Conan encontra, agachado atrás de uma mesa completamente revirada, o assistente do kithanês, Dalius. Nas mãos leva uma adaga ensanguentada, de pouca valia contra a espada do cimério.
- Saqueando os pertences de seu senhor, abutre?
– Não… Sim… Asketh está desaparecido. E sem o ouro que me paga, nada tenho.
– Leve o que quiser. Apenas me interessa o que ele guardava no subterrâneo da casa.
– De que está falando?
– Asketh escondia o mais valioso de seus tesouros embaixo da terra, como fazem os mortos da Stygia.
– Nada sei disso. Mas ele passava muito tempo nesta sala. É possível que a entrada esteja aqui, em algum lugar.
O bárbaro recomenda a Plácido que leve alguns dos pertences do feiticeiro morto. O interesse do soldado recai sobre uma estátua de cerca de dois metros de altura – uma gárgula sobre um pedestal. Seus olhos são grandes e brilhantes rubis.
- Não toque nisso, soldado. Mesmo o meu mestre, que conhecia os segredos sombrios de terras distantes, temia o poder dessa imagem maligna.
Saudoso do tempo em que feiticeiros e seus truques eram objeto de histórias contadas ao redor de fogueiras, tão fantasiosas quanto inocentes, Conan encerra qualquer poder contido no ídolo ao despedaçá-lo no chão. Os grandes rubis rolam entre lascas de pedra. Dalius mal contem um gemido, enquanto Conan e Plácido ficam, cada um, com um dos olhos da gárgula.
Só então o bárbaro encontra as marcas de um alçapão.
****
Sob o piso, Conan percorre uma passagem estreita amparada por estacas. Dez passos além do alçapão há um baú. Empunhando uma tocha, Dalius ilumina o caminho do bárbaro. Plácido permanece junto da abertura no chão, observando.
Um golpe de espada vence a tranca, revelando pergaminhos, ervas raras e o medalhão descrito por Athicus. Tomando a joia, Conan prepara-se para fazer o caminho de volta. Entretanto, não é mais Plácido que guarda a passagem. Um ser de rocha pura, cujas feições vagamente lembram as do soldado de Zhenkri, barra o seu caminho. Seu único olho de rubi brilha cheio de ódio assassino.
O ser de pedra avança golpeando Dalius, cujo crânio é partido instantaneamente. Conan aproveita a brecha e brande a lâmina, apenas lascando o torso de seu adversário. Movido por feitiços ancestrais, a criatura agarra Conan, estrangulando-o. A força do bárbaro não pode conter os músculos e tendões de pedra. A espada lhe escapa dos dedos.
Para a surpresa do cimério, o abraço mortal é interrompido assim que a estátua viva percebe, caído da algibeira de Conan, um rubi que agora repousa no solo de terra batida. Enquanto recupera o fôlego e se esgueira na direção da saída, o bárbaro ouve um urro de dor e satisfação. Empurrando o rubi contra a órbita antes vazia, a gárgula agora lança um olhar rubro de redobrada perversidade.
Conan golpeia as estacas e inicia um desabamento. Toneladas de terra deslocam-se, comprometendo a estrutura da residência de Asketh. Conforme as fundações são afetadas, é uma questão de tempo até as paredes ruírem. Por muito pouco aquela não se torna a cova do cimério.
****
Conan mal tem forças para voltar ao palácio de Zhenkri. Novamente, não encontra obstáculos em seu caminho. Ao fechar a grade atrás de si, seu corpo inteiro sofre de dores e tremores incontroláveis. Em questões de minutos, Athicus está diante dele.
- Trouxe o que lhe pedi, Conan?
– Maldito feiticeiro. Veneno…
– Apenas algo que pudesse garantir a sua lealdade. Veja, tenho aqui comigo o antídoto.
– Passe para cá esse frasco e eu lhe entrego o medalhão.
– Prefere que eu aguarde sua morte e entre aí para pegar o que me pertence?
Ensandecido pelo ódio, Conan arremessa a espada que a escuridão da cela escondia. A lâmina, dirigida ao coração de Athicus, erra o alvo. A guarda choca-se contra as grades e interrompe seu voo mortal.
- E eu que admirei sua sagacidade logo cedo, Conan. Quanta decepção…
– Tome, maldito. Leve o seu medalhão.
– Ah… Sim… Aqui está o seu antídoto. Apresse-se em tomá-lo. Não gostaria que você morresse, nem que diga que nós, homens civilizados, não cumprimos com nossa palavra.
Após esvaziar o frasco, Conan cai em um sono sem sonhos.
« Última modificação: Janeiro 16, 2015, 05:07:42 pm por Hentges »